Por L.C. Dias
"Se o Cristo voltasse ao mundo em nossos dias, a primeira declaração que faria aos cristãos seria esta: Povos cristãos, sabei que eu não sou cristão."
Nietzsche
"A única chance de cristificar a humanidade é voltarmos à cristicidade da mensagem real do Cristo, que não está condicionada a tempo e espaço, mas é uma mensagem tipicamente extra-temporal e extra-espacial, porque, como dizia Tertuliano, toda a alma humana é crística por sua própria natureza.“
Huberto Rohden
"A única chance de cristificar a humanidade é voltarmos à cristicidade da mensagem real do Cristo, que não está condicionada a tempo e espaço, mas é uma mensagem tipicamente extra-temporal e extra-espacial, porque, como dizia Tertuliano, toda a alma humana é crística por sua própria natureza.“
Huberto Rohden
Introdução
No atual contexto planetário, caso se pretenda obter uma compreensão mais ampla e fidedigna das causas mais profundas que subjazem à atual crise, não devemos subestimar o poder ainda latente das distorcidas crenças cristãs que continuam enraizadas nas profundezas da psique coletiva ocidental.
Essas crenças foram forjadas, maculando os ensinamentos crísticos originais, desde os primórdios da cristandade, pelo conluio eclesiástico com os poderes de "César", com o único propósito de manipular, por meio da culpa, medo e opressão, as coletividades humanas que estavam sob a sua nefasta influência.
Portanto, neste estudo organizado em capítulos, será apresentada uma reflexão transreligiosa sobre um dos fundamentos do credo cristão - Jesus Cristo - fazendo uma breve incursão no fascinante universo das cristologias alternativas, buscando desvelar, muito além dos dogmas da tradição e da já agonizante teologia cristã, o real significado do Cristo.
A cristologia é a área da teologia que aborda questões relativas à pessoa e natureza de Jesus Cristo e o propósito de sua missão. A cristologia tradicional emergiu de um longo e penoso processo de fomentação, debate, contestação - ou supressão - de controvérsias. O resultado, após vários séculos, foi o entendimento de que Jesus Cristo era e continua sendo uma única "pessoa", totalmente humana, mas também verdadeiramente divina: a Segunda Pessoa da Trindade. Essa compreensão sofreu o teste do tempo e ainda é afirmada como verdade infalível pelas igrejas romanas, ortodoxas orientais, luteranas, anglicanas e reformadas. Ao longo dos últimos 250 anos, alguns teólogos liberais se concentraram na humanidade de Jesus, a ponto de negar sua divindade. (1)
Neste sentido, para indicar o enfoque que será dado nesta exposição, assumo a mesma posição firmada por Huberto Rohden em relação ao Cristianismo:
“Por que esta discrepância entre Cristo e cristianismo? Porque é impossível identificar o Cristo com alguma organização religiosa; qualquer tentativa destas é necessariamente uma deturpação e uma falência. Toda a organização é produto do ego, e esse ego é, por sua natureza, egocêntrico, e por isso anti-crístico.
A única coisa que pode haver é uma experiência crística individual, mas nunca uma organização cristã social. Diversas pessoas têm tido e têm experiência crística; e onde há muita plenitude há necessariamente um transbordamento. Se houvesse muitos homens individuais com genuína experiência crística, o mundo social seria grandemente beneficiado por essa plenitude individual.
A cristicidade de muitos produziria, por via indireta, uma espécie de cristianismo social por indução.
Mas o que é impossível e contraproducente é que o espírito do Cristo seja expresso por uma organização qualquer, como o ocidente tem tentado inutilmente. Disto sabia o Cristo quando preveniu os seus conterrâneos, dizendo: ‘O reino dos céus não vem com observâncias, nem se pode dizer ei-lo aqui, ei-lo acolá! O reino dos céus está dentro de vós’." (2)
"A mística é uma experiência estritamente individual, que, quando organizada socialmente, deixa de existir, assim como vida encaixotada não é vida, luz engarrafada não é luz. É da íntima essência da experiência mística ser individual, o que todavia não impede que essa verticalidade individual se desdobre em horizontalidade social; mas esse desdobramento ou transbordamento só acontece quando a experiência vertical atinge o zênite da sua plenitude.
O nosso mundo conturbado não pode ser sanado por nenhuma nova organização, religiosa ou civil; somente a experiência mística de muitos pode beneficiar realmente a humanidade.
Toda a mística verdadeira e plena é irresistivelmente transbordante e difusora; se não for isto, não passa de misticismo, mas não é uma mística dinâmica.
O Cristo nunca organizou nada, nem no âmbito religioso da Sinagoga de Israel, nem no setor civil da política do Império Romano. A sua atuação foi exclusivamente indireta, por espontâneo transbordamento da sua própria plenitude, porque, como diz Paulo de Tarso, nele habitava corporalmente toda a plenitude da Divindade.
Durante quase três séculos, do ano 33 até 313, a cristandade das catacumbas vivia dessa cristicidade mística, sem nenhuma organização social. E foi este o período mais glorioso do mundo cristão, o período da verticalidade mística das catacumbas, cuja única saída era para o martírio no Coliseu.
Sabemos que no ano 33, foi Jesus entregue à morte pelo beijo de um de seus discípulos – mas muitos ignoram que o mesmo Cristo, no ano 313, foi assassinado pelo beijo de outro discípulo dele, o primeiro imperador cristão Constantino Magno. O beijo de Judas matou o corpo de Jesus – o beijo de Constantino matou o espírito do Cristo.
O beijo com que Constantino Magno traiu o Cristo foi o Edito de Milão, do ano 313, que pôs termo a três séculos de perseguição – mas com este benefício de discípulo preludiou séculos de malefícios de traidor: convidou os discípulos do Cristo a se integrarem na organização do Império Romano; fez do cristianismo a religião oficial do Estado, uma religião estatal, defendida mediante armas, política e dinheiro – armas para matar os inimigos, política para enganar os amigos, dinheiro para comprar e vender consciências.
O Edito de Milão foi o fim de três séculos de cristicidade – e o princípio de muitos séculos de cristianismo, social, político, militar. O cristianismo de Constantino continua até hoje no mundo oficial, das igrejas e de alguns governos. Paralelamente, à sombra das catacumbas do silêncio e da solidão, continua em algumas almas a cristicidade dos místicos, cujos nomes não constam e cujas estátuas não figuram em praças e salões." (3)
"A verdadeira mensagem do Cristo é perfeitamente compatível com a mais alta evolução cultural da humanidade – mas não com as nossas teologias cristãs.
A única chance de cristificar a humanidade é voltarmos à cristicidade da mensagem real do Cristo, que não está condicionada a tempo e espaço, mas é uma mensagem tipicamente extra-temporal e extra-espacial, porque, como dizia Tertuliano, toda a alma humana é crística por sua própria natureza.“ (4)
Neste sentido, serão apresentadas, para aprofundamento, estudo e reflexão, diversas visões cristológicas alternativas às crenças cristãs tradicionais, na esperança que essas visões heréticas e heterodoxas possam despertar, nas almas mais sensíveis e abertas, a necessidade de resgatar o real significado de Jesus, do Cristo e da verdadeira mensagem crística para um mundo em transição.
O presente estudo cristológico será particionado da seguinte forma:
Parte 1 - De Jesus a Cristo
Parte 2 - Jesus gnóstico, o Aeon da salvação
Parte 3 - Esoterismo cristológico
Parte 4 - O Cristo de Kardec, Oxalá, Rohden e Ubaldi
Parte 5 - Revelações crísticas, o alvorecer de uma consciência planetária
Por L.C. Dias
Notas:
(2) Que Vos Parece do Cristo?, Huberto Rohden, Editora Martin Claret.
(3) Ibidem
(4) Ibidem
Revisado em 16.07.2019
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