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De tudo e de todas as coisas: O legado de Gurdjieff

Por L.C. Dias

"O homem que dorme não pode 'realizar'. Com ele, tudo é feito no sono. Aqui o sono não é entendido no sentido literal do nosso sono orgânico, mas no sentido de existência associativa. Primeiro que tudo, o homem deve estar acordado. Tendo despertado, verá que, sendo como é, não poderá 'realizar'. Terá que morrer voluntariamente. Quando estiver morto, poderá nascer. Todavia, o ser que acabou de nascer precisa crescer e aprender. Quando tiver crescido e aprendido, então 'realizará'."
G. I. Gurdjieff

George Ivanovich Gurdjieff foi um dos mestres espirituais mais provocadores, paradoxais e enigmáticos do nosso tempo. O seu biógrafo o chamou de "enganador, mentiroso, embusteiro, canalha" - e em seguida passou a descrever a sua "simpatia, compaixão, caridade" e o seu "excentrico código de honra. Ele é especialmente lembrado por transmitir, através dos métodos mais extraordinários e difíceis, os princípios fundamentais de um sistema esotérico conhecido como o Quarto Caminho; também chamado, austeramente, de o "Trabalho". (1)

O psiquiatra chileno Claudio Naranjo, precursor da psicologia transpessoal, estudioso e divulgador do Eneagrama - ferranenta ancestral de autoconhecimento trazida para o ocidente pelo próprio Gurdjieff - fez o seguinte comentário sobre esta controvertida personalidade:

"O lugar de Gurdjieff no mundo das doutrinas e dos mestres espirituais é misterioso, intrigante e, decididamente, muito importante. De fato, ele foi - tomando emprestada uma expressão sua, retirada de um opúsculo escrito durante sua residéncia temporária na França - um anunciador do bem que está para vir. Hoje, quando aquilo que antes era esotérico agora está entrando no mercado e, praticamente, na vida de toda a gente, e quando o barakath está afetando milhares de pessoas, talvez seja necessário algum esforço de imagição para nos colocarmos em posição de sentir o transe deste homem, um iniciado de uma antiga escola esotérica, que tomou a si o encargo de mostrar ao mundo ocidental que a humanidade está adormecida, que há níveis de existência mais elevados e que, em algum lugar, há pessoas que sabem. Ele certamente teve ambiente e dotes para extrair a essencia de muitas doutrinas e apresentá-la depurada de adendos e de adereços culturais, numa forma apropriada para a situação em que o mundo se encontrava. Um dos enigmas a seu respeito é o contraste entre sua aparente qualidade de mestre e o fato de não ter conseguido, durante toda a sua vida, elevar qualquer um dos seus discípulos até o seu nível e assim fundar uma doutrina na plena extensão da palavra. Todavia, quando o julgamos, não pelos ensinamentos que ministrou a alguns poucos, mas por seu papel na história da cultura e da espiritualidade, ele não fracassou. Sozinho, conseguiu ministrar um choque, ao mundo Europeu e Americano, talvez mais importante do que qualquer outro ocorrido até a onda cultural do princípio da década de sessenta (do século passado) ." 

Sobre Gurdjieff, Charles T. Tart, professor de Psicologia da Universidade da Califórnia, fez a seguinte declaração: 

"A medida que progride o meu conhecimento pessoal e cientifico da consciência humana, mais me impressiono com o gênio de Gurdjieff, o qual foi capaz de reunir as tradições espirituais do Oriente e do Ocidente, numa síntese conceitual que fala de perto aos ocidentais de hoje." 

Do ponto de vista da evolução que nos é permitida, segundo Gurdjieff, vivemos num lugar que tem uma posição muito inferior no universo. Por causa da extrema densidade das leis mecânicas que operam em nosso planeta, a auto-realização oferece dificuldades quase máximas, de modo que, embora os seres humanos sejam distinguidos, por assim dizer, com o potencial para elevar o nível do seu ser, é muito tênue a probabilidade que tem qualquer indivíduo em particular de ser bem sucedido nessa realização. Por causa dos fatores que operam contra todos nós, o individuo pode ter certeza de que o seu desenvolvimento interior não será fácil; ao contrário, exigirá grande compreensão e trabalho hábil, e este trabalho só pode ter início quando percebemos a verdade acerca da condição humana. Platão comparou o ser humano a alguém fascinado pelas sombras que estão dançando nas paredes do fundo de uma caverna; um alguém, tão absorvido naquilo, que não dá atenção ao mundo que está atrás de si. Gurdjieff compara o estado humano "normal" àquele de um prisioneiro. Sendo assim, a libertação depende, primeiramente da percepção da verdade acerca da nossa condição. Quando esta compreensão tiver atingido o alvo, para fazer alguma coisa a respeito não basta ser muito inteligente ou estar intensamente motivado; instruções precisas, mapas e conhecimento se fazem necessários daqueles que já se libertaram, e estas ferramentas devem ser usadas cooperativamente. (2)

Já para Jacob Needleman, professor de Filosofia da San Francisco State University, as principais ideias de Gurdjieff podem ser resumidas da seguinte forma:

"O Homem, Gurdjieff ensinou, é uma criação em desenvolvimento. Ele não é realmente o Homem, considerado como um ser cosmicamente único cuja inteligência e poder de ação é espelhar as energias da fonte da própria vida. Pelo contrário, o homem como nós somos é um autômato. Seus pensamentos, sentimentos e ações são pouco mais do que as reações mecânicas a estímulos externos e internos. Ele não pode fazer nada. Ao redor dele, tudo acontece sem a participação de sua própria consciência autêntica. Mas os seres humanos são ignorantes deste estado de coisas por causa da influência penetrante da cultura e da educação, que gravam neles a ilusão de serem seres conscientes autônomos. Em suma, o homem está dormindo. Não há autêntica existência em sua presença, mas apenas um egoísmo que se disfarça como a própria fé, e cujas maquinações mal imitam as funções humanas normais de pensamento, sentimento e vontade.

Muitos fatores reforçam este sono. Cada uma das reações que procedem em sua presença é acompanhada por uma sensação enganosa do homem ter muitos eus, cada um imaginando-se ser o todo, e cada fragmento sem consciência dos outros. Cada um destes muitos eus representa um processo pelo qual a energia sutil de consciência é absorvida e degradada, um processo que Gurdjieff chamou de "identificação". O homem identifica, isto é, desperdiça sua energia consciente, com cada pensamento passageiro, impulso, e sensação. Este estado de coisas tem a forma de um auto-engano contínuo e uma procissão contínua de emoções egoístas, tais como raiva, auto-piedade, sentimentalismo, e medo que são de uma natureza tão difusamente dolorosa que o homem está constantemente dirigindo sua atenção para melhorar esta condição através da busca incessante de reconhecimento social, prazer sensorial ou um objetivo vago e irrealizável de felicidade." 

Continuando com Needleman:

"De acordo com Gurdjieff, a condição humana não pode ser entendida além de sua participação dentro da função da humanidade na vida orgânica da terra. O ser humano é construído para transformar energias de natureza específica, e nem o seu desenvolvimento interno potencial, nem a sua presente situação real é compreensível para além desta função. Assim, no ensino de Gurdjieff, a psicologia está intimamente ligado com a cosmologia e metafísica e até, em certo sentido, com a biologia. O diagrama conhecido como "Raio de Criação", fornece uma das chaves conceituais para abordar esta interligação entre a humanidade e a ordem universal e, como tal, convida a um repetido estudo a partir de uma variedade de ângulos e fases de entendimento." 

E mais adiante, falando sobre a nossa responsabilidade frente a transição planetária, pela perspectiva de Gurdjieff:

"Como os seres humanos irão mudar este estado de coisas e começar a processar as energias conscienciais universais que eles foram criados para absorver, mas que agora passam por eles de forma não transformada? Como é que a humanidade irá assumir o seu lugar na grande cadeia do ser? A resposta de Gurdjieff a essas questões realmente circunscreve o objetivo central de seu ensino, ou seja, que a vida humana na Terra pode agora estar em um importante ponto de transição comparável talvez à queda das grandes civilizações do passado e que o desenvolvimento de todo o ser do homem (em vez de uma ou outra das funções humanas separadas) é a única coisa que pode permitir que a humanidade possa passar por essa transição de maneira digna, em conformidade com a grandeza do destino humano." (3)

O legado de G. I. Gurdjieff foi organizado em dez livros distribuídos em três séries intitulado "De tudo e de todas as coisas":

- Série 1. Três livros sob o título de “Uma Crítica Objetivamente Imparcial da Vida do Homem,” ou, “Relatos de Belzebu a Seu Neto.”
- Série 2. Três livros sob o título comum de “Encontros com Homens Notáveis.”
- Série 3. Quatro livros sob o título comum de “A Vida Só É Real Quando ‘Eu Sou’”.

Todos os escritos foram dirigidos à solução de três problemas centrais segundo a visão de Gurdjieff:

- Série 1. Destruir, impiedosamente, sem qualquer compromisso de qualquer ordem, na mente e no sentimento do leitor, as crenças e visões, enraizadas por séculos nele, sobre todas as coisas existentes no mundo.
- Série 2. Familiarizar o leitor com o material necessário para uma nova criação e provar sua solidez e boa qualidade.
- Série 3. Ajudar o despertar, na mente e no sentimento do leitor, de uma verdadeira e não fantástica representação, não do mundo ilusório que ele agora percebe, mas sim, do mundo que na realidade existe. (4)

Apesar de não ser um especialista do Quarto Caminho, pude observar, nos estudos preliminares que fiz sobre o pensamento de Gurdjieff, isto já conta uns 10 anos, que três ideias centrais podem ser destacadas: o Sono, a Prisão e o Alimento. 

A humanidade vive um sono desperto, um estado de sonambulismo, e esta vida semi-consciente, com suas emoções e pensamentos descontrolados, serve como alimento energético para uma instância superior hiperdimensional dentro de uma cadeia alimentar cósmica. Neste contexto, a humanidade, como um rebanho, cumpre sua suposta destinação, imersa em um cárcere onírico imposto por uma realidade espaço-temporal fabricada. 

Na minha opinião, este cenário serviu de inspiração para as ideias que fundamentaram o enredo das novas mitologias conspiratórias modernas de manipulação global como, por exemplo, na trilogia cinematográfica Matrix. 

Portanto, seria a base filosófica do sistema de Gurdjieff um esforço de atualização do material legado pelas tradições de sabedoria do passado, visando desvelar o propósito oculto da vida humana para uma época de grandes transformações planetárias? 

Neste sentido, todas as técnicas e ensinamentos práticos do Quarto Caminho, o Trabalho, visam superar esta condição de inconsciência servil, como podemos concluir a partir dessas eloquentes palavras de Gurdjieff:

"Você não percebe sua própria situação. Você está numa prisão. Se você é um homem sensível, tudo o que pode desejar é fugir. Mas, como poderá fugir? É preciso cavar um túnel sob uma parede. Um homem sozinho não poderá fazer nada. Mas vamos supor que haja dez ou vinte homens - se eles trabalham em turnos e um encobre o outro, podem completar o túnel e fugir. Mais ainda, ninguém pode escapar da prisão sem a ajuda daqueles que escaparam antes. Somente estes podem dizer qual meio de fuga é possível, ou podem mandar ferramentas, limas, ou o que quer que possa ser preciso. Mas, um prisioneiro sozinho não pode encontrar essas pessoas ou entrar em contato com elas, é preciso uma organização. Nada pode ser conseguido sem uma organização."

A seguir, a resenha da obra "De tudo e de todas as coisas", feita por J.G. Bennett para o Riders Review, em outono de 1950. John G. Bennett (1897-1974), cientista, matemático e filósofo inglês, integrava pesquisa científica com estudos de idiomas asiáticos e religiões. Conheceu Gurdjieff e Ouspensky em 1920, na Turquia. Esteve no Prieuré. Depois foi discípulo de Ouspensky. Restabeleceu contato com Gurdjieff em Paris. Após a morte de Gurdjieff, ensinou o Trabalho na Inglaterra.

Neste estudo, Bennett busca elucidar a inerente contradição de um "livro que desafia a análise verbal" e conclui que os "Contos de Belzebu" são um trabalho memorável que representa a primeira mitologia inovadora dos últimos 4000 anos.

Um trabalho profundo, maduro e inspirador, desenvolvido de forma magistral por um dos principais discípulos de Gurdjieff. Uma apologia lúcida deste legado de sabedoria imortal, atualizado de forma providencial para a nossa época, que com certeza poderá auxilar e guiar a nossa humanidade nesses tempos conturbados de transição planetária. 

L.C. Dias 

Notas:

(1) Esoterismo e Magia no Mundo Ocidental, Jay Kinney, Editora Pensamento. 
(2) O Trabalho de Gurdjieff, Kathleen Riordan Speeth, Editora Pensamento. 
(3) Gurdjieff Electronic Publishing 

De tudo e de todas as coisas de Gurdjieff: Um estudo por J. G. Bennett

Durante o verão de 1916, Ouspensky registrou uma conversa em São Petersburgo, na qual Gurdjieff tratou do problema da comunicação e da impossibilidade de transmitir em nossa linguagem idéias que só são inteligíveis e óbvias para um estado superior de consciência. Falando da unidade entre o homem, o Universo e Deus, ele disse que não se pode expressar em palavras ou em formas lógicas o estado de conhecimento objetivo necessário para entender essa unidade. Neste ponto, Gurdjieff fez uma declaração chave para a compreensão de suas obras subseqüentes. Ele disse:

"Levando em conta a imperfeição e a fraqueza da linguagem comum, as pessoas que tiveram um conhecimento objetivo tentaram expressar a idéia de unidade em 'mitos', 'símbolos' e 'fórmulas verbais particulares', que, sendo transmitidas sem mudança, passaram esta ideia de uma escola para outra e, frequentemente, de uma era para outra." (1)

Em "Tudo e Todas as Coisas", Gurdjieff usa extensivamente essas três idéias: símbolo, mito e forma verbal. Hoje em dia, quando a matemática é importante, não há necessidade de defender o uso do simbolismo. Muitas escolas do pensamento moderno consideram o simbolismo como a única forma segura de linguagem. Wittgenstein (2) trata os símbolos como algo mais do que os signos convencionais, considerando que eles correspondem, de algum modo, à realidade a que se referem. Wittgenstein provavelmente aceitaria a opinião de Gurdjieff: "Os símbolos não apenas transmitem conhecimento, mas indicam o caminho para isso".

Embora outros pensadores neguem qualquer referência objetiva aos símbolos, ninguém nega que o simbolismo tenha um poder além da linguagem comum. Com a linguagem dos mitos, isso é diferente, algo que os pensadores superficiais desprezaram, mas que os melhores filósofos conheceram seu valor. Whitehead escreveu:

"O pai da filosofia européia, em um de seus muitos estados pensantes, ditava o axioma de que as verdades mais profundas deveriam ser anunciadas através dos mitos. Certamente, a história subsequente do pensamento ocidental justificou sua intuição." (4)

Toynbee segue a trilha de Platão e diz:

"Vamos fechar os olhos para as fórmulas da ciência para abrir nossos ouvidos à linguagem da mitologia." (5)

Whitehead atribui o valor das imagens mitológicas ao fato de não nos envergonharmos das contradições que surgem das manifestações da realidade traduzidas em palavras lógicas. Mesmo Cassirer, um exímio sacerdote da linguagem matemática, considera o pensamento mítico como uma das formas a priori em que a mente humana trabalha, e um modo irredutível de interpretar as experiências (6).

Todas essas afirmações são verdadeiras, mas talvez não tanto quanto seus autores as entendem. A linguagem mítica deriva seu poder do fato de que ela unifica o que é desesperadamente separado do pensamento lógico: o mundo interior da experiência humana e o mundo externo que chamamos de Universo.

A importância das "fórmulas verbais" como uma maneira de transmitir verdades objetivas tem sido negligenciada pelos pensadores modernos, com a possível exceção de Whitehead, e ainda assim a forma verbal que Gurdjieff usou em "Tudo e Todas as Coisas" é precisamente próprio do que muitos vêem como o ideal mais elevado da linguagem, em que o significado de uma expressão é criado pela força da experiência interna. Nas mãos de Gurdjieff, essa forma de linguagem adquire enorme poder.

Comecei a escrever sobre "Tudo e Todas as Coisas" desta forma porque é, em um aspecto, um experimento em forma lingüística. Gurdjieff usa todos os dispositivos linguísticos do simbolismo abstrato ao mito, do aforismo à imagem pictórica, da simplicidade e franqueza do inglês antigo à reiteração e exuberância do Oriente. Mas a forma lingüística é sempre o modo e não o fim. Há, então, uma importância especial na forma de linguagem que Gurdjieff usa para expressar o que Whitehead chamou de "verdades profundas".

Nas revisões que apareceram no livro, "Tudo e Todas as Coisas" geralmente tem sido descrito como uma alegoria ou epopeia cosmológica. Isso ignora a distinção entre alegoria e mito. (7) Alegoria é uma forma de expressão mais fraca e sofisticada do que o mito. Faz parte da nossa linguagem comum, na qual podemos apenas expressar idéias familiares. Os mitos que até hoje são formas simbólicas do nosso pensamento mais profundo, existem desde o alvorecer da história. Toynbee disse que nenhum gênio que surgiu nos últimos quatro mil anos foi capaz de criar um novo mito. Isso equivale a dizer que, durante quarenta séculos, a humanidade não descobriu uma nova abordagem para "verdades profundas".

Acho que ele está certo, e é uma medida do lugar que eu designaria para o trabalho de Gurdjieff na história do pensamento humano que encontrei em "Tudo e Todas as Coisas", uma nova mitologia cujo poder só será compreendido por gerações que ainda estão por nascer. 

Não é de surpreender que os escritos de Gurdjieff tenham sido ridicularizados e incompreendidos pelas próprias pessoas que professam desejar, acima de tudo, que um novo fator de espiritualidade seja introduzido na vida humana. Com visão profética, Albert Schweitzer escreveu quase cinquenta anos atrás:

"Não sabemos qual é o objetivo final para o qual nos movemos, nem sabemos o que trará um novo modo de vida que regulará os princípios dos séculos vindouros. Podemos apenas imaginar e adivinhar qual será a poderosa ação de algum gênio poderoso e original, cuja verdade e conveniência serão evidenciadas pelo fato de que, trabalhando em nossa pobre medida, nos oporemos a ele com todos os nossos recursos. Nós, que supostamente desejamos ansiosamente por um gênio poderoso o suficiente para abrir com autoridade um novo caminho para o mundo, em vista do fato de que não podemos seguir adiante por este caminho ao longo do qual tão laboriosamente preparamos." (8)

Tendo dito tudo isso, eu poderia ser dispensado em seguir adiante. Se Gurdjieff disse que não pode ser expresso em linguagem comum, então seria tolice tentar uma tradução. Isso é verdade, e aqueles que estudaram "Tudo e Todas as Coisas" durante anos, na forma manuscrita em que estiveram disponíveis para seus alunos imediatos, estão bem conscientes sobre seus "conselhos amigáveis" de que o livro deveria ser lido por três vezes para um benefício específico "que espero que você alcance com todo o meu ser". Mesmo com muito estudo, as verdades mais profundas do ensinamento de Gurdjieff permanecem intraduzíveis sem empobrecê-las.

Infelizmente eu já fui longe demais e não posso evitar o desafio de explicar o que quero dizer dizendo que Gurdjieff disse algo novo que não é expresso em mitos ou filosofias dos últimos quatro mil anos. Toynbee disse, com razão, que a linguagem da mitologia evita as contradições lógicas inerentes a cada um dos comentários sobre as relações entre Deus e o Universo:

"É lógico que se o Universo de Deus é perfeito, não pode haver um Diabo fora dele, mas se o Demônio existisse, a perfeição com que consegue estragar deve ter sido incompleta pelo próprio fato de sua existência." (9)

Toynbee concebe corretamente algum tipo de demônio tão necessário para o processo de criação, mas permanece envolvido no dualismo do bem e do mal, de vontades conflitantes, de propósitos antitéticos. Este conflito é encontrado em todos os nossos mitos, do chinês Yin Yang, no Livro de Jó ou no Fausto de Goethe, como também, no moderno mito do materialismo dialético. O dualismo permanece incorporado em todo o nosso pensamento. Até mesmo Whitehead, que rejeita o que ele chama de "dualismo cruel de Descartes", a "bifurcação da Natureza", diz que:

"Em todo o Universo reina a união dos opostos que é a fonte do dualismo." (10)

Gurdjieff rejeita especificamente o mito do bem e do mal. Ele coloca em seu lugar um mito da Criação no qual a própria existência do Universo está sujeita a invalidar e determinar condições que tornam intrinsecamente impossível o completo entendimento do Propósito Sagrado. O fato de sucessivas atualizações ao longo do tempo impõe a cada processo o preço da incompletude e da imperfeição. Este é o "Heropass" Impiedoso que:

"Não tem fonte sobre a qual sua aparência deva depender, mas como o "amor divino" sempre flui ... independentemente por si mesmo." (11)

Para Gurdjieff, o Tempo tem ao mesmo tempo o caráter absoluto do Scholium da Definição VIII do Principia de Newton (12) e a tendência disruptiva da segunda Lei termodinâmica, que segundo Eddington: "detém a posição suprema entre as leis do natureza. "(13)

No mito de Gurdjieff, o Heropass desaparece pela infinita sabedoria do Criador, não como um inimigo ou princípio antagônico, mas como um fato inelutável, a mesma condição de possibilidade de existência. Daí segue o princípio Trogoautoegocratico, segundo o qual a harmonia permanente do Universo é assegurada pela alimentação recíproca de tudo o que existe. Penso que essa concepção foi fracamente entendida pelos autores dos antigos Upanishads e nos mitos da Serpente de muitas correntes, mas nunca foi entendida como o remédio exclusivo contra o poder destrutivo do Tempo.

No mito de Gurdjieff, o Universo passa a existir para assegurar a perpétua auto-renovação do Sol Absoluto ou Primeiro Princípio. Essa concepção é tão necessária para a compreensão do destino humano que Gurdjieff, em seu capítulo final, "Do Autor", traduz em linguagem comum. Tudo o que vive deve servir "a todos os propósitos universais". O homem não está isento dessa necessidade e deve, por sua vida ou por sua morte, contribuir com sua cota para a transformação de energia na qual se processa a manutenção recíproca toda existência. 

Ao mesmo tempo, a mãe natureza deu ao homem a possibilidade de não ser apenas uma ferramenta cega a serviço desses objetivos universais, mas ele a serve realizando seu próprio destino para trabalhar por si mesmo, por sua própria individualidade egoísta.

Esta possibilidade também foi dada para o serviço do propósito comum devido ao fato de que, para o equilíbrio dessas leis objetivas, essas pessoas relativamente livres são necessárias.

Embora tal intento seja possível, é difícil, no entanto, dizer se algum homem em particular é capaz de alcançá-lo.

O homem, então, tem um duplo destino: viver como escravo inconsciente de um propósito universal ou pagar a dívida de sua própria existência e assim obter independência individual, com tudo o que isso acarreta para a possibilidade de auto-aperfeiçoamento, de libertação. Nos ensinamentos de Gurdjieff sobre o destino humano, encontramos a concepção religiosa fundamental do homem como um ser que precisa ser salvo. Salvação, além disso, só é possível através da redenção acima. Gurdjieff, embora preservando concepções comunais para todas as principais religiões, apresenta-as de uma maneira nova e penetrante. Para mencionar um exemplo, eu diria que sua doutrina do Pecado Original, expressa no mito do órgão Kundabuffer, é profundamente mais satisfatória do que qualquer coisa que possamos encontrar nas teologias orientais ou ocidentais. Isto recorda o propósito declarado dos Contos de Belzebu para o seu neto, a saber:

"Destruir a mentalidade e os sentimentos do leitor, de uma maneira implacável e determinada, as crenças e pontos de vista (que durante séculos estiveram enraizados nele) sobre tudo o que existe no mundo." (15)

De um modo superficial, "Tudo e Todas as Coisas" é uma sátira crua sobre a natureza humana. Ele expõe cruelmente nossa antiga fraqueza em relação à vaidade, credulidade e amor-próprio. Em suas descrições da vida moderna, Gurdjieff baseia-se em suas próprias observações penetrantes coletadas em seus quarenta anos de viagens em todos os continentes e na maioria dos países. Sua combinação de inteligência e compaixão o capacita a falar dos absurdos de nossas vidas privadas de uma maneira que ofenderá apenas aqueles que não desejam encarar a verdade. Onde tudo isso nos leva? Rejeitando o dualismo do bem e do mal, Gurdjieff tem que colocar em prática algum princípio regulador de validade universal. Isso nos leva a um tema recorrente do livro que desafia a análise verbal. É a doutrina de Gurdjieff: "o Sagrado Impulso da Consciência Divina".

Gurdjieff está preocupado em despertar a convicção de que não só há algo terrivelmente errado em "nossa existência comum de ser", mas também há uma maneira de escapar a uma vida mais adequada para os humanos "criados à imagem de Deus".

O leitor atento não pode deixar de sentir que está na presença de alguém que esteve neste mundo superior e sabe como alcançá-lo. Quando se estuda o livro, a ideia, que se torna convicção, emerge que o caminho que Gurdjieff chama de "trabalho consciente e sofrimento intencional" pode certamente levar à imortalidade e à esperança de se reunir com a Fonte de Tudo que existe. 

Em "Everything and All Things", Gurdjieff não tenta provar nada, isto é, não usa nenhum argumento lógico, nem explica o significado de declarações mais importantes. Este significado só pode ser encontrado confrontando passagens em diferentes contextos. Em muitos casos, o significado das palavras só começa a tomar forma quando as situações a que correspondem são experimentadas. Como a mera leitura do livro pode despertar a convicção de que sua tese fundamental é verdadeira? Uma grande parte, mas não toda, é devida às "fórmulas verbais" que, para Gurdjieff, são um dos elementos da linguagem objetiva.

Isso se aplica especialmente à doutrina da Consciência, na qual Gurdjieff estabelece o "Impulso Sagrado da Consciência Sagrada" como princípio regulador do comportamento. É a antítese da moralidade, que nada mais é do que um sistema de regras externas com apenas um significado local e transitório. Sobre a moralidade, Gurdjieff diz que ela tem:

"Exatamente aquela "propriedade única" que faz parte do ser que leva o nome camaleão." (16)

A própria ideia de Consciência Objetiva desafia a análise. É tão perigoso quanto poderoso. A religião institucional rejeita seu próprio julgamento interior em favor de princípios morais e normas de conduta, não apenas para garantir um melhor controle de seus seguidores; Existe um perigo real de que a ideia de Consciência possa degenerar em auto-suficiência e licença. Gurdjieff enfrenta o desafio com a fórmula de Ashiata Shiemash:

"Somente aquele que adquire Consciência de si mesmo será chamado e se tornará o Filho de Deus." (17)

Esta fórmula é tratada como axiomática, isto é, sem necessidade de explicação ou discussão. Seu significado é transmitido com a ênfase que Gurdjieff coloca na natureza da mudança interior que deve ocorrer no homem antes que ele seja capaz de viver de acordo com os ditames da consciência . Neste sentido, "Contos de Belzebu para seu neto" é um comentário sobre a doutrina da Consciência, pois explica o processo do aparecimento da Consciência no neto de Belzebu, Hassein, desde o capítulo 7, quando ele vê momentaneamente o significado do dever até o capítulo 46, em que sua compreensão das leis universais é misturada com uma compaixão esmagadora pelo sofrimento humano.

Consciência e compaixão são inseparáveis. A cosmogonia de Ashiata Shiemash, chamada "O Terror da Situação", contém a quintessência do ensinamento de Gurdjieff sobre a vida humana no planeta Terra. Se o homem quiser alcançar seu destino, ele deve se exonerar da mancha do Pecado Original, expressa como consequência do órgão Kundabuffer. Por isso o homem deve trabalhar, lutar e sofrer, mas onde está o desejo suficiente para despertar a necessidade deste trabalho?

A religião ortodoxa responde que deve vir do Impulso Sagrado da Fé, Amor e Esperança. Mas a história da raça humana mostrou que esses impulsos são ineficazes contra as Forças do egoísmo, vaidade, auto-estima, sugestão e assim por diante, que afetam tudo o que o Homem encontra. Fé, esperança e amor são tão deformados que não podem mais servir de impulso para a perfeição pessoal (Libertação).

Gurdjieff nos ensina que apenas e somente permanece puro um impulso sagrado que reside nas profundezas da psique humana. Este é o impulso sagrado da Consciência que não pode ser destruído. É implantado pela graça divina. A respeito disso, com um toque de delicadeza, Gurdjieff expõe em uma sentença sua doutrina dos sofrimentos de Deus:

"Os fatores para essa Consciência surgem, nos seres vivos de "três cérebros", da localização das partículas das "emanações de tristeza" de nosso criador sempre amoroso e infinitamente sofredor; esta é a razão pela qual a fonte da manifestação da consciência genuína nos seres de três centros é às vezes chamada de representante do criador." (18)

A doutrina da compaixão é encontrada dentro de outra fórmula verbal que manifesta o pré-requisito para o processo de purificação pessoal pelo qual um ser pode se tornar digno de se reunir com a Primeira Fonte de Tudo Existente. O purgatório é representado como uma condição de possível existência apenas para seres que já adquiriram uma individualidade independente, e foram aperfeiçoados além da razão objetiva do que pode acontecer, em sua experiência, além das limitações do sistema planetário em que se nasceu. Mas essas habilidades não são suficientes. Nem a força interior do libertado nem a sua aspiração em direção à perfeição final é suficiente; Sem compaixão pelos outros seres, não é possível progredir mais. Tudo isso é expresso em uma fórmula verbal que consiste nas palavras que encontramos na entrada principal do Plano do Purgatório Sagrado, decretando o seguinte:

"Somente aqueles que se colocam no lugar dos outros como resultado do trabalho podem entrar." (19)

Com isso, chegamos à "cadeia conclusiva" do último capítulo, "Do Autor", onde:

"Cada um de nós deve propor, como objetivo principal, tornar-se, no curso de nossa vida coletiva, um Mestre. Mas não um Mestre no sentido e significado que esta palavra implica para o indivíduo atual, mas no sentido de que qualquer homem, graças ao seu eu mais profundo, no sentido objetivo, age com devoção para com àqueles que o rodeiam - isto é, realiza atos manifestados de acordo com os ditames de sua própria e mais pura razão - desta forma adquire em si mesmo algo que por si só restringe a todos os que o rodeam a necessidade para curvar e executar suas ordens." (20)

A máxima satisfação para o homem é saber que ele pagou a dívida de sua existência, e ele está livre daquele momento em diante para servir ao propósito para o qual foi criado.

Isso não significa que, para Gurdjieff, a vida seja reduzida a uma autonegação. A verdadeira felicidade do homem é possível em todas as fases de sua existência, mas devemos ter em mente que:

"A verdadeira felicidade do homem só pode vir de uma infelicidade, também real, que ele tenha experimentado." (21)

Não há nada de novo no conteúdo desta questão. O novo e necessário para o nosso tempo é a ênfase do pagamento inevitável; Gurdjieff nos ensinou que a sabedoria está em pagar antecipadamente. Ao escrever sobre as fórmulas verbais de Gurdjieff, eu me desviei da tarefa de esclarecer o que quero dizer ao afirmar que Gurdjieff criou uma nova mitologia.

Em resumo, há pouco de novo. Não é preciso muita pesquisa para descobrir a afinidade que existe entre a cosmologia de Gurdjieff e o neoplatonismo do Ocidente ou o Sankhya e o Abhidharma do Oriente. É fácil ver onde ele foi inspirado por fontes cristãs (especialmente no Cristianismo Ortodoxo Grego), budistas (principalmente Mahayana e Zen), muçulmanos (particularmente Derviche e Sufi), e fontes da antiga sabedoria egípcia e da Assíria. A originalidade de seu ensino não está em sua matéria-prima, mas em seu uso. Seu mito sobre a Criação como um cenário universal onde o esforço da Divindade se manifesta é completamente permeável às conseqüências do simples fato de sucessivas atualizações no Tempo. Ao escrever essas palavras, recordo vigorosamente o " Espaço, tempo e divindade" de Alexander (22) , e uma comparação dos dois livros é certamente uma demonstração da incomensurável superioridade da linguagem do mito e relação a fórmula verbal da análise lógica, mesmo que sejam Inspirados, da mesma forma, por uma imaginação poética. O que está faltando em escritores como McTaggart, (23) Alexander e Whitehead é a sensação de que o sofrimento e o esforço do Universo realmente importam.

Com Gurdjieff, o drama do Universo se torna uma realidade da vida presente.

Involução e evolução não são nem boas nem más (24), nem em oposição nem complementares entre si. Elas são igualmente necessários para os propósitos divinos.

Elas estão interligadas pelo feedback de toda a existência, que não é nem evolução nem involução. Aqui e em toda parte, a mitologia de Gurdjieff é completamente triádica e não dualista. Os problemas do homem, do Universo e de Deus são resolvidos em termos de uma real necessidade mútua para a qual a filosofia não encontrou uma expressão adequada. Do drama cósmico surge o destino miraculoso para o qual o homem é chamado, se estiver disposto a pagar o preço. Já que o próprio Universo é um esforço perpétuo; O destino mais alto do homem não é a felicidade estática, mas o cumprimento imortal de um propósito eterno.

Notas:

1 P. D. Ouspensky, In Search of the Miraculous, 1949, p. 279. 
2 Ludwig Wittgenstein, Tractatus Logico-Philosophicus, 1922. 
3 In Search of the Miraculous, p. 280. 
4 A. N. Whitehead, Modes of Thought, 1938, p. 14. 
5 Arnold Toynbee, A Study of History, [in 12 Vols. 1934–1961], Vol. I, p. 271. 
6 E. Cassirer, Die Philosophie der Symbolischon Formen, Bd. II, pp. 107–111. 
7 See the admirable discussion of this distinction by Dorothy Emmet, in The Nature of Metaphysical Thinking, Macmillan, 1946, p. 100. 
8 Albert Schweitzer, The Quest of the Historical Jesus, 1906, p. 6. 
9 A. Toynbee, A Study of History, Vol. I, p. 279. 
10 A. N. Whitehead, The Adventures of Ideas, 1933, p. 245. 
11 All and Everything, 1950, p. 124. 
12 Isaac Newton, Mathematical Principles of Natural Philosophy, 1687. 
13 Sir A. Eddington, The Nature of the Physical World, 1929, p. 74. 
14 All and Everything, 1950, p. 1219. 
15 Ibid, p. V, where Gurdjieff unequivocally states his purpose in each of the three series of All and Everything. 
16 Ibid, p. 343. 
17 Ibid, p. 368. 
18 Ibid, p. 372. 
19 Ibid, p. 1164. 
20 Ibid, p. 1236. 
21 Ibid, p. 377. 
22 Samuel Alexander, Space, Time and Deity, 2 Vols., 1920. 
23 John McTaggart Ellis, Cambridge atheistic idealist, best known for Mind, 1908. 
24 All and Everything, 1950, p. 1137–40. It is a wrong use of words to label either obedience or love as good and the other as evil. Evolution is ‘against God,’ and yet upon it He has “placed all His hopes and expectations for the future welfare of Everything Existing.” Ibid, p. 197.

Nota do Tradutor: O texto foi adaptado e revisado a partir da versão preliminar fornecida pelo Google Tradutor (translate.google.com.br).


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