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Normose e Separatividade

Por Pierre Weil 

“Tomar consciência da normose e de suas causas constitui a verdadeira terapia para a crise contemporânea. Trata-se, também, de encontrar a liberdade. Seguir as normas cegamente é tornar-se escravo. Quando aprendemos a escutar a voz interior, a voz da verdadeira sabedoria, tornamo-nos livres.“ 
Pierre Weil 

“Estar adaptado a uma sociedade profundamente doente não é sinal de saúde.” 
Krishnamurti 

“O Eu (Ego) não é senhor em sua própria casa. (...) Eu sei que Eu sou Eu, mas Eu não sei que Eu sou Sujeito do desejo inconsciente.” 
Freud 

Segundo o psicólogo francês Pierre Weil, sofremos, coletivamente, de uma patologia que está arrastando a humanidade e, consequentemente, todas as formas de vida do planeta para uma provável aniquilação total. 

Tal epidemia de dimensões globais teria diversas matizes e sintomas, sendo sua principal etiologia uma crença inconsciente enraizada nas profundezas da psique humana, que, por sua vez, dá sustentação ao nosso senso de identificação egoica, nomeada por Weil como a Fantasia da Separatividade. 

Portanto, vejamos como Weil descreve esta patologia: 

“A normose pode ser considerada como o conjunto de normas, conceitos, valores, estereótipos, hábitos de pensar ou de agir aprovados por um consenso ou pela maioria de pessoas de uma determinada sociedade, que levam a sofrimentos, doenças e mortes. Em outras palavras: que são patogênicas ou letais, executadas sem que os seus autores e atores tenham consciência da sua natureza patológica.” 

E mais especificamente sobre a Fantasia da Separatividade: 

“Trata-se de uma ilusão, de uma miragem, que consiste em nos perceber como separados do mundo exterior, como se não tivéssemos nenhuma relação com este. As conseqüências desta ilusão são o desenvolvimento de emoções destrutivas tais como o apego a tudo que nos dá prazer neste mundo exterior e a rejeição e raiva contra tudo que nos ameaça de dor e sofrimento. São estas as maiores causas de tensão e stress, que levam à doenças e sofrimentos, os quais reforçam ainda mais a fantasia da separatividade. As pessoas entram assim num círculo vicioso em que repetem compulsivamente o mesmo comportamento.“ 

A seguir, serão apresentados alguns estudos de Weil que aprofundam o tema, inclusive um importante relato autobiográfico onde o próprio Weil descreve o seu processo de cura normótica. 

Autômatos ou seres humanos conscientes? 

A característica comum a todas as formas de normose é seu caráter automático e inconsciente. Podemos falar, no caso, do espírito de cordeiros. De um modo geral, os seres humanos, por preguiça e comodismo, seguem o exemplo da maioria. Pertencer à minoria é tornar-se vulnerável, expor-se à crítica. Por comodismo, as pessoas seguem e repetem o que dizem os jornais: se está impresso, deve estar certo! Quantas não aderem a uma ideologia, religião ou partido político só porque é moda ou para serem bem vistas pelos demais? 

Uma maneira disfarçada de manipular as opiniões e mudar os sistemas de valores é anunciar que eles são adotados pela maioria da população. Nesse sentido, toda normose é uma forma de alienação. Facilita a instalação de regimes totalitários e dos sistemas de dominação. 

Nas empresas, o autômato não toca o alarme quando é necessário. Como o burocrata, ele segue as normas e o regulamento ainda que estes ameacem levar o negócio à falência. Nas religiões, o normótico é, muitas vezes, um excelente praticante de rituais e cumpridor das leis, mas permanece cego e não sabe o que faz.Os crimes da Inquisição perpetuam-se até nossos dias na terrível violência ritual de algumas seitas satânicas. 

Por isso é importante alertar para a responsabilidade dos educadores, cujas mãos podem moldar autômatos normóticos ou seres humanos plenamente lúcidos. Os automatismos se dissolvem com a tomada de consciência. 

Tomar consciência da normose e de suas causas constitui a verdadeira terapia para a crise contemporânea. Trata-se, também, de encontrar a liberdade. Seguir as normas cegamente é tornar-se escravo. Quando aprendemos a escutar a voz interior, a voz da verdadeira sabedoria, tornamo-nos livres. 

Essa é uma visão geral e introdutória à questão imprescindível da normose. Estou certo de que muito poderemos aprender e juntos nos aprofundar neste criativo e instigante horizonte, buscando transcender a patologia da normalidade, na direção da plenitude humana. 

FONTE: Normose – A Patologia da Normalidade, Pierre Weil; Jean-Yves Leloup e Roberto Crema, Vozes, 2011. 

Normoses gerais e específicas 

O número de normoses é muito grande. Cada dia que passa descobrimos um ou vários tipos em áreas as mais inesperadas. Uma vez que assimilamos o conceito, se torna impossível não ver o seu alcance. Muito mais; tudo se passa como se antes desta descoberta a gente estivesse cego. O próprio conceito se comporta como um poderoso revelador, facilitando a tomada de consciência de aspectos essenciais à preservação da nossa saúde e existência. 

Podemos distinguir duas grandes categorias de normoses: as normoses gerais e as normoses específicas. 

As normoses gerais são as que possuem um consenso comum a praticamente toda a humanidade. É o caso por exemplo da aceitação do cigarro ou da fantasia da separatividade da qual iremos tratar daqui a pouco. 

As normoses específicas tem o seu consenso restrito a determinada nação, população, grupo social ou cultural. Podemos dar como exemplo a prática do duelo entre os homens de classe nobre da Europa até o início deste século ou ainda o uso de assentos que deformam aos poucos a coluna vertebral dos passageiros da classe de motoristas. 

Inúmeras outras categoria podem ser criadas em função de diversos parâmetros. Assim sendo, dentro da categoria das normoses específicas podem ser criadas inúmeras outras categorias ou subgrupos, segundo por exemplo o tipo de patologia ou de morte a que leva a normose ou ainda ao consumo de determinados produtos ou alimentos. Podemos assim falar de normoses cancerígenas, quer dizer, as que levam à patologia cancerosa. Usamos também a categoria de normose de consumo que inclui os inúmeros objetos e serviços prestados e que se revelam patogênicos ou letais. 

Normoses Gerais 

Vamos começar dando um exemplo de normose geral. A consideramos como sendo a mais perversa de todas as normoses. Antes de conhecer o conceito de normose, escrevemos um livro inteiro sobre o assunto com o título: A Neurose do Paraíso Perdido Esta Neurose começa com uma verdadeira Normose, a qual intitulamos de "Fantasia da Separatividade". Trata-se de uma ilusão, de uma miragem, que consiste em nos perceber como separados do mundo exterior, como se não tivéssemos nenhuma relação com este. As conseqüências desta ilusão são o desenvolvimento de emoções destrutivas tais como o apego a tudo que nos dá prazer neste mundo exterior e a rejeição e raiva contra tudo que nos ameaça de dor e sofrimento. São estas as maiores causas de tensão e stress, que levam à doenças, e sofrimentos, os quais reforçam ainda mais a fantasia da separatividade. As pessoas entram assim num círculo vicioso em que repetem compulsivamente o mesmo comportamento. 

Outro exemplo de normose geral que atinge toda a humanidade é a de considerar como normal o uso das guerras para resolver conflitos e desavenças entre nações. Existe até um conceito jurídico de "guerra justa" que sanciona esta normose bélica. 

Esta última normose é ainda reforçada por outra normose que faz com que os povos acreditem piamente serem proprietárias da terra que ocupam, levando demasiadamente a sério as fronteiras e os limites territoriais. Esquecem que nas fronteiras é que nascem os conflitos violentos, sejam fronteiras territoriais, ideológicas, epistemológicas, políticas ou religiosas. 

O próprio sentimento de propriedade é também produto de uma normose geral. Podemos em última instância considerarmos como proprietários de objetos. Porém, todos são constituídos de materiais provindos da terra? Somos proprietários da Terra? Uma das causas essenciais da destruição ecológica é a normose de posse da Terra. Até muito recentemente a humanidade inteira se conduzia como se fosse proprietária da Terra, achando que podia explorá-la indefinidamente. Aliás, a crença de que os recursos naturais são inesgotáveis também é uma normose geral em plena regressão. 

Mais uma causa fundamental de destruição da vida no nosso planeta é a Normose Consumista já conhecida sob o termo de Consumismo. É ela que deu ensejo ao aparecimento do novo conceito econômico de Desenvolvimento Sustentável ou melhor ainda Viável. A Normose consumista transforma a população do mundo num verdadeiro formigueiro destrutivo da vida no planeta. 

Normoses Específicas

No domínio da alimentação encontramos inúmeros tipos de normoses, as quais podemos agrupar sob o termo de "Normoses Alimentares". Um exemplo clássico e histórico encontramos na China quando da introdução pelos ingleses das indústrias de refinação do arroz. Começou a aparecer o beribéri que não se manifestava entre os consumidores de arroz integral. 

Nesta categoria podemos colocar todos os alimentos industrializados cancerígenos tais como os corantes alimentares e as conservas enlatadas. O consumo de açúcar refinado é uma das causas de cáries dentárias nas crianças que comem muitas balas. Uma outra normose específica refere-se a certos países produtores de café, os quais produzem uma dependência a este produto gerando cardiopatias e excitação nervosa. 

Aliás nesta categoria alimentar podemos colocar todos os alimentos que praticamente todo mundo consome mas que são patogênicos. Vamos listar alguns a título de exemplo: Batata frita (Colesterol), Doces (Diabetes), Excesso de Sal (Hipertensão), Refrigerantes (Obesidade). 

Ainda dentro da categoria de normoses alimentares, convêm lembrar o consumo de álcool sob todas as suas formas de vinho, cerveja, licor, whisky, cachaça etc. Esta normose é reforçada por inúmeros rituais: Antes da refeição tem o aperitivo, depois vêm os vinhos variados associados especificamente com certos tipos de pratos, seguidos por licor com café, sem contar celebrações diversas regadas com champanhe ou fartura de cerveja. Ao longo do tempo se instalam o alcoolismo com as suas nefastas conseqüências íntimas, familiares e sociais, sem contar a cirrose hepática, o delirium tremens e a morte, para os que não conseguiram se moderar. 

Hiper consumo de carnes, mereceria uma referência especial já que um relatório das Nações Unidas recomenda a alimentação vegetariana, já que apenas uma diminuição de dez por cento do consumo de carne, somente nos USA, permitiria com a economia realizada, alimentar em grãos toda a população faminta do Planeta. 

Outra Normose provinda do consumo é a do uso de carros. Embora se saiba que a poluição provocada pelo consumo de gasolina ameace a vida dos cidadãos duas vezes: através da impureza do ar e da radiação provocada pelos buracos da câmara de ozônio, a produção aumenta. 

As normoses ligadas ao consumo são reforçadas pela pressão das mídias através da publicidade e da propaganda. No caso do cidadão comum há uma crença baseada em princípios democráticos de que caberia um carro para cada cidadão do mundo, o que nas condições atuais seria um verdadeiro suicídio coletivo. 

Existem muitos outros tipos de normoses específicas que merecem estudos especiais. Por exemplo no domínio da ciência há uma normose materialista e mecanicista que dita comportamentos e decisões perigosas para a vida no planeta devido a sua ligação com paradigmas ultrapassados. O mesmo acontece no campo da Medicina dominada por uma visão própria da normose da Ciência em geral. 

Existe uma normose comum à maioria das religiões que consiste em acreditar na sua própria superioridade sobre as demais o que leva a conflitos e mesmo a guerra. Outra normose religiosa que sustenta os fanatismos é a que consiste em se ater ao pé da letra dos textos sagrados esquecendo o espírito e a época em que foram redigidos assim como os seus aspectos de mensagens simbólicas. 

A descrença da ciência atual em relação à existência de dimensões parapsicológicas e transpessoais da realidade pode também ser considerada como normose levando a um credo científico ocidental. 

No domínio das relações amorosas, existe uma normose bastante destruidora do amor verdadeiro; é a normose sexual que leva milhões de seres humanos a confundir amor com sensualidade, limitando as suas relações com o outro sexo aos seus aspectos puramente genitais. 

Vamos citar ainda como último exemplo uma normose educacional que podemos chamar de normose racionalista que decorre de uma deformação da Ciência no sentido do antigo paradigma racionalista newtoniano-cartesiano o qual só aceita a lógica racional e os cinco sentidos como meios de conhecer a verdade. A Educação copiou este modelo reprimindo os seus aspectos intuitivo e sentimental. 

Poderíamos multiplicar os exemplos. Mas o espaço que resolvemos consagrar ao presente artigo o impede. 


Um relato autobiográfico de cura normótica 

A maneira mais simples de fazê-los entender do que se trata (a normose) será contando um pouco do que se passou comigo há algumas décadas. Isso nos levará, ao mesmo tempo, aos aspectos pessoais e sociais que levaram à criação do conceito de normose. Lembro-me da crise existencial pela qual passei aos trinta e três anos de idade. Com o conhecimento que tenho hoje, identifico-a como conseqüência de uma normose. Foi, tipicamente, a crise de um normótico que ainda não sabia nada a respeito da normose. Fazia prosa sem o saber, como diz um jargão popular. 

Por que afirmo que eu era normótico? Minha crise ocorreu por eu ter procurado ser normal, de ter realizado o que uma sociedade recomendava e recomenda até hoje sobre o que é ser um homem bem-sucedido. A sociedade, por meio dos meus pais, moldara um ser humano bem-sucedido aos trinta e três anos. Um homem de sucesso porque eu tinha tudo: tinha a minha residência, tinha a minha casa de campo, tinha a minha piscina, tinha meu cargo na universidade, tinha o meu cargo junto ao presidente do maior banco da América Latina, tinha o meu consultório, tinha o meu livro best-seller, tinha entrevista na televisão, tinha, tinha, tinha, tinha… E minha normose era, justamente, ter. Havia introjetado toda uma civilização do ter. Eu tinha, tinha tudo e estava muito infeliz, não era um homem realizado. Conformado a este contexto, eu acabei tornando-me normótico. 

Por quê? Porque eu segui a norma que me levou à patologia: a patologia moral – era profundamente infeliz; a patologia social – me divorciei porque, quando se está infeliz, culpam-se os outros; e uma patologia orgânica – a separação me levou a fazer um câncer. Então, já temos o conceito da normose: é o conjunto de hábitos considerados normais e que, na realidade, são patogênicos e nos levam à infelicidade e à doença. Embora resumida, é a definição que eu tenho seguido até hoje, muito útil e clara. Para sair da normose, deitei no divã do psicanalista e resolvi aprender e praticar ioga. Foi numa sessão de ioga que descobri a relatividade do conceito de normalidade. Vou contar a história, pois é muito ilustrativa. Todas as quartas feiras à noite nosso grupo se reunia e o professor nos fazia relaxar, com música, e meditar. Depois, cada um relatava a sua experiência. Um dizia: eu vi um ser. 

Outro: eu vi cores. Outro ainda dizia: eu vi formas. Um mais: eu tive uma inspiração maravilhosa. E, quando chegou minha vez, eu disse: gente! Eu estou tapado. Eu não estou vendo nada! Isso transcorreu durante um ano. Foi aí que comecei a observar a relatividade do conceito de normalidade: nesse grupo, todo mundo tinha visões e eu não. Então, o grupo era normal e eu era anormal. Lá fora, nos dois milhões de habitantes de Belo Horizonte, quase ninguém tinha visões. Então, eu era normal e o grupo era anormal. Foi quando comecei a cogitar sobre a relatividade do conceito de normalidade. 

A fantasia da separatividade 

O estudo da ioga me levou ao hinduísmo, ao budismo e ao conceito de maia. Constatei que essa nossa maneira de ver as coisas é uma fantasia. Mais tarde, eu a denominei de fantasia da separatividade. 

Quando criamos a Universidade Holística, ao fazer o estudo da gênese da destruição da vida no planeta, descobrimos que sua raiz está em que consideramos a ilusão como normal. É um conceito provido de consenso social, que pode levar ao suicídio da humanidade. A isso se acrescentou, então, a noção de consenso: uma crença partilhada por uma maioria. 

Os estudos de ioga me levaram a fazer um retiro com lamas tibetanos. 

Fui para esse retiro especialmente para entender por que os tibetanos insistiam no Maia: termo sânscrito, que significa ilusão, em seu sentido mais geral como um sonho em nossa vida cotidiana. Ou seja, a semelhança entre o estado de consciência de vigília e o onírico. E lá eu aprendi, por mim mesmo, por meio do sonho lúcido, que a nossa vida cotidiana é como se fosse um sonho. Não tem muita diferença não. E todos acreditam nesse sonho. Voltamos à noção de normose e de consenso. 

Um dia, em 1986, ao sair do retiro tibetano, Jean-Yves Leloup me convidou para um simpósio sobre a normalidade, no Centro Internacional de Saint-Baume. O local era um tipo de universidade holística, com um ambiente como o da Unipaz, que ele dirigia, no sul da França. Lá se encontrava e podia ser visitada a gruta onde Maria Madalena se refugiou depois da passagem de Jesus. E lá, a seu pedido, proferi uma palestra sobre as anomalias da normalidade. 

Então, surgiu a ideia de que a normalidade podia ser patológica e patogênica. Todo o seminário versou sobre a definição do que é normal, tarefa nada fácil. O que é normal, afinal? De qualquer forma, a criação do conceito de normose nos força a buscar definir o que não o é. 

Um conceito que me trabalhou 

Fiz uma experiência em que procurei colecionar todas as atribuições que se costuma fazer às pessoas julgadas anormais. Por exemplo: você é um idiota; você é um irresponsável; você é maligno, etc. Fiz uma coleção de umas trinta ou quarenta epítetos. Em seguida, traduzi-os ao seu contrário, pensando que, talvez dessa forma, poderia definir o que é normal. Para surpresa minha, saiu uma lista do que é um santo. Por esse procedimento empírico, um ser normal seria um santo. Será? Deixo a idéia para reflexão. 

Depois disso, o conceito de normose ficou me trabalhando porque um conceito novo nos trabalha. De vez em quando, eu o usava nas palestras. Notei que, a cada vez que pronunciava a palavra normose, as pessoas riam muito. Percebi, então, que a reflexão estava mexendo com alguma coisa fundamental. Inquietava as pessoas. Pouco a pouco me dei conta, entretanto, que esse é um conceito fundamental em psicologia, em sociologia, em antropologia, em educação e nas demais disciplinas e áreas de atuação humana. Mais ainda: evidencia um processo psicossociológico que ameaça a humanidade e as outras espécies vivas no planeta Terra. Uma verdadeira fonte de sofrimentos e de tragédias, das mais diversas proporções. Foi quando realizei uma primeira classificação das normoses. E continuo descobrindo outras em minhas reflexões cotidianas. 


A neurose do paraíso perdido 

O homem se caracteriza, em seu comportamento cotidiano, por uma busca constante de felicidade, de alegria de viver, de paz interior; ele procura o prazer e foge da dor. 

Isto mostra que existe profundamente enraizada no âmago de seu ser, a memória de um estado de plenitude sem obstáculos e de êxtase permanente. 

Esta memória enterrada no âmago de sua existência constitui a motivação fundamental de todas as suas ações, quer sejam elas, julgadas como positivas ou como negativas. 

A busca da felicidade permanente leva-o, no plano físico, a procurar sensações agradáveis de toda a espécie: ver e contemplar formas humanas ou cênicas agradáveis, saborear iguarias deliciosas, trocar carícias sensuais que conduzam ou não ao orgasmo, cantar ou ouvir a música da natureza ou a sinfonia de uma orquestra, sentir o perfume de uma rosa. No plano afetivo, sua busca de amor e de troca de ternura e de alegria não tem fim. No plano cognitivo, uma curiosidade, muito freqüente insaciável, fá-lo apreciar as alegrias da descoberta, assim como a euforia da criatividade literária e artística. 

Existe, pois, uma espécie de lei inscrita em cada ser: é feito para a alegria e não para o sofrimento. 

Entretanto, parece que um obstáculo fundamental impede a maioria dos seres de viver plenamente esta felicidade para a qual parece existir, ela lhes escapa, sem que tenham consciência da causa deste fracasso constante. 

Nenhum destes prazeres ou alegrias que acabamos de descrever dura. E lá onde havia felicidade sobrevém a frustração de seu desaparecimento. O homem busca um estado permanente, alguma coisa nele lhe dá a certeza da existência de tal estado; no entanto, encontra apenas a impermanência. 

Feito para a felicidade, sua existência toma a cor da insatisfação. 

Existe dentro de cada um de nós um sentimento muito profundo de insatisfação; este, muito freqüentemente, está oculto, sobretudo entre as pessoas que se acham felizes, por estados provisórios de descarga de tensões, devido à satisfação de certas necessidades; mas esta satisfação é transitória e é justamente o caráter impermanente do prazer a ela ligado, que provoca um apego à memória do prazer cujo caráter fantasmático abastece a natureza do desejo. 

E, damo-nos conta, cedo ou tarde, conforme o caso, que a satisfação completa não existe, pois apenas passamos alternativamente da tensão à descarga, e da satisfação à tensão; constatamos, por vezes amargamente, que passamos nosso tempo em busca de uma felicidade permanente que não se encontra nem na abundância de alimento, nem no conforto, nem na segurança relativa de nossas casas, nem em nosso conhecimento das posições eróticas daquilo que pensamos ser o amor, nem na embriagues que nos proporcionam os poderes de qualquer tipo. Nosso sistema socioeconômico de consumo exagerado de segurança, de sensações e de poder, embora tenha diminuído em grande parte a miséria da insuficiência de satisfação de necessidades vitais, não forneceu a felicidade que os regimes políticos nos prometem, sobretudo no caso daqueles que já atingiram o nível de conforto de um rei ou de um imperador, como existiram antigamente, e em nome do qual foram feitas e continuam a serem feitas revoluções sangrentas. E, não é a revolução da informática que vai resolver este problema, especialmente quando entrevemos o que se está fazendo com ela. 

E quanto mais temos mais queremos, basta comparar as reivindicações populares nos países economicamente desenvolvidos e no terceiro mundo... Tem se confundido a felicidade com o bem-estar do conforto e da abundância. 

Sem dúvida alguma, torna-se indispensável que se terminassem com a miséria e que se escolhessem os sistemas socioeconômicos mais eficientes para isso. Mas convém também, e paralelamente, ou melhor, ainda mostrar a todos de uma maneira integrada, através de uma nova abordagem da existência, como sair do círculo vicioso da insatisfação e reencontrar este paraíso perdido, o qual certamente não se situa lá onde a propaganda dos meios de comunicação o coloca. 

O conforto e a abundância são importantes, mas não dão automaticamente a paz de espírito e a alegria no coração. 

Ainda é necessário aprender como se relacionar com todos estes “benefícios” de nossa civilização tecnológica. 

Basta observar o que acontece com aqueles que atingiram, enfim, este nível socioeconômico e este conforto tão ambicionado. No plano físico, as doenças de carência desapareceram, felizmente. Mas são substituídas por novos males: a coluna vertebral se deforma e tensões musculares se desenvolvem sob o efeito de poltronas e camas macias, terminam por sentar-se no chão e dormir sobre colchões pomposamente chamados “ortopédicos”. Em suma, dormem sobre o duro, como o índio e o pobre. 

Comem demais, empanturram-se de doces e confeitos, e para evitar o “diabetes” e as doenças do fígado, submetem-se àquilo também pomposamente chamado de orientação "dietética”. E acabam por comer a mesma coisa ou até menos que o índio e o pobre, a menos que se internem em uma clínica de jejum... Paga-se caro, muito caro, para aprender a não comer! E à custa de refinar nossa alimentação, recaímos em novas doenças de carência, sem contar as intoxicações químicas de todos os tipos; então, oferecem-nos um novo tipo de alimento o qual chamamos pomposamente de biológico, orgânico e integral; em suma, fazem-nos ingerir o pão preto do pobre e o arroz integral do índio. 

No plano emocional, o progresso que nos é oferecido resulta de uma interpretação simplista da obra de Freud, de uma extrapolação apressada da psicanálise, a qual, originalmente, é uma pesquisa sobre a natureza da neurose, extrapolação acerca do homem sadio, de uma compreensão errônea de conclusões tiradas da patologia; ela leva a um reducionismo grosseiro cujas consequências desastrosas começam a se fazer sentir em todos os domínios, mais especialmente na educação onde a confusão e a desorientação atingiram um grau máximo. Pais e educadores não sabem mais o que fazer. O raciocínio oferecido ao público é muito simples: uma vez que a neurose resulta de uma repressão dos instintos, de um recalque, para evitar a doença psicossomática, libe remos os instintos, satisfaçamos todas as necessidades; e, sobretudo, permitamos às crianças toda a liberdade; para evitar os complexos, façamos aquilo que elas queiram! Os resultados saltam aos olhos: a dissolução do superego no adulto e sua má estruturação na criança provocaram uma liberação dos aspectos egóticos do id: agressão e violência em todas as formas, possessividade, competição sem limites, indiferença à miséria física e moral. E, como veremos adiante, aparece uma nova repressão, a repressão dos valores relacionados à beleza, à verdade, ao amor universal, à criatividade, valores que, quando recalcados, provocam também doenças de carência, a começar pelo mal estar e o sentimento difuso de insatisfação próprio daqueles que têm tudo para estarem satisfeitos e que se encontram, no âmago de si mesmos, profundamente infelizes. 

Terminamos, então, por buscar estes valores que existem ainda, principalmente nas pessoas de vida simples, nos pobres e, como mostram as pesquisas não sociocêntricas, nos índios, naqueles que chamamos de “selvagens” e que se tornaram hostis em relação ao branco dito civilizado, porque este invadiu seu habitat, violou suas mulheres, impôs sua maneira egocêntrica e selvagem de viver e fomentou lutas fraticidas entre as tribos para poder aniquilá-los e apoderar-se de suas terras. 

No plano mental instala-se a instabilidade: passamos de um assunto a outro sem mais nenhuma direção definida, reina uma incoerência completa entre opiniões, atitudes e comportamentos; a pessoa é democrata, anti-racista e socialista, desde que não se aumentem os seus impostos para se fazerem empréstimos ao terceiro-mundo; e principalmente que a filha não se case com um negro ou um judeu... 

Somos dominados pelo pensamento, cuja natureza é contraditória; como não temos, atualmente, tempo de pensar, somos arrebatados pelo devaneio que nos deixa em uma atitude de estupor mental, diante desta dialética sem saída. Alguns, causados pelos conflitos permanentes refugiam-se no álcool e na droga; a perda do sentido da vida aumenta a porcentagem de suicídios, como ocorre nos países economicamente muito desenvolvidos; o cinema, a televisão, o jogo, não são mais suficientes para atordoar-nos; no plano sexual, estamos entediados, impotentes ou frígidos. 

A preguiça se instala: para que se esforçar? Temos botões para tudo e máquinas para calcular, pensar, traduzir, raciocinar, organizar e logo, talvez, criar, como já querem alguns. 

É verdade que alguns reagem contra este estado de coisas: “retornam à terra”, praticam alpinismo, caçam na África, arriscam a vida, um pouco como o pobre e o índio... 

De fato, o ser humano procura a fonte da felicidade fora de si mesmo, não mais percebe que é vítima de uma ilusão de ótica, de uma fantasia fundamental; esta fantasia constitui a fonte desta busca compulsiva e repetitiva deste paraíso que no fundo jamais perdeu, mas que apenas está velado. Este véu é a fantasia da separatividade. (1) 

NOTA

(1) Introdução do Livro "A NEUROSE DO PARAÍSO PERDIDO", Pierre Weill. Editora CEPA, 1987. 


Leitura Complementar: 

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Por L.C. Dias “Dentro do diabólico jogo de marionetes que move o proscênio da história, se oculta a mesma mão que move o bispo com sua mitra, o papa com sua cruz, o gendarme com seu bastão. Devemos encarar e questionar o manipulador de marionetes. Ele pode ser o mesmo ser que faz voar os OVNIs.” “Quando eu me aproximei da Ufologia, nos anos 60, pensei que a hipótese extraterrestre era a melhor de todas as que havia para explicar o fenômeno. Mas fui forçado a mudar de opinião porque os dados que coletei contradizem essa hipótese.” “Teoricamente, é possível que a forma de consciência envolvida — seja ela extraterrestre ou não — é tão avançada ou estranha a nós que a questão de interação com ela seja realmente insolúvel.” “O fenômeno OVNI realmente existe. Nesta base, só nos resta renegociar o que entendemos por realidade.” Jacques Vallée O astrofísico e cientista da computação Jacques Vallée é uma voz dissonante no campo das ideias ufológicas nos últimos 50 anos. Cons

Além da Crença - Apresentação

Por L.C. Dias "Não se satisfaçam com ouvir dizer, ou com a tradição, ou com o conhecimento das lendas, ou com o que nos dizem as escrituras, conjeturas ou inferências lógicas, ou em pesar as evidências, ou com a predileção por um ponto de vista depois de ter ponderado sobre ele, ou com a habilidade de alguma outra pessoa, ou em pensar 'O monge é nosso mestre'. Quando souberem por si próprios: 'Tais coisas são sadias, irrepreensíveis, recomendadas pelos sábios, e adotá-las e colocá-las em prática conduzem ao bem-estar e a felicidade', então vocês deveriam praticá-las e nelas repousar."  O Buda - Kalama Sutta Todos temos crenças, mesmo quando estamos certos que não as temos. Até os descrentes creem que em nada creem. Quando não as possuímos é porque elas nos possuem. Sejam conscientes ou inconscientes, as crenças moldam a nossa visão de mundo, determinam como nos apresentamos, nossa identidade, como também, a forma como interagimos com a vida no

Além da Crença Cristã - Introdução

Por L.C. Dias "Se o Cristo voltasse ao mundo em nossos dias, a primeira declaração que faria aos cristãos seria esta: Povos cristãos, sabei que eu não sou cristão."  Nietzsche "A única chance de cristificar a humanidade é voltarmos à cristicidade da mensagem real do Cristo, que não está condicionada a tempo e espaço, mas é uma mensagem tipicamente extra-temporal e extra-espacial, porque, como dizia Tertuliano, toda a alma humana é crística por sua própria natureza.“ Huberto Rohden Introdução No atual contexto planetário,  caso se pretenda obter uma compreensão mais ampla e fidedigna das causas mais profundas que subjazem à atual crise,  não devemos subestimar o poder ainda latente das distorcidas crenças cristãs  que continuam enraizadas nas profundezas da psique coletiva ocidental.  Essas crenças foram forjadas, maculando os ensinamentos crísticos originais, desde os primórdios da cristandade, pelo conluio eclesiástico com os poderes de "César&q

Além da Crença Cristã - Parte V: Revelações crísticas, o alvorecer de uma consciência planetária

Por L.C. Dias “Pois nada há de oculto que não venha a ser revelado, e nada em segredo que não seja trazido à luz do dia.”  Marcos 4:22   "A sintonia com a Consciência Divina e o total domínio de si deve ser a sua razão de viver e única meta."  Cartas de Cristo   “Mas aqui nesta dimensão, você se lembra qual é a verdadeira vontade de Deus: incorporar-se em você, inspirá-lo, experienciar a criação através de você e finalmente reconhecer-Se na sua face. Deus queria tornar-se humano através de você. O objetivo da evolução do universo é VOCÊ: Deus feito homem!”  Jeshua  "Os textos sagrados têm sua história. Os médiuns, os profetas também têm sua história, que vai influenciar para melhor ou para pior a qualidade de sua mensagem. Quando alguém se apresenta como o canal de uma palavra ou de uma revelação que vai além dele, não seria errado nos interrogarmos sobre o local, a profundidade de onde lhe vem sua inspiração."  *** "Sobre que vers

Um outro mundo é possível: Metanoia pessoal e coletiva como solução para a crise espiritual planetária

Por L.C. Dias “Se você assume que não existe esperança, então você garante que não haverá esperança. Se você assume que existe um instinto em direção à liberdade, então existem oportunidades de mudar as coisas.” Noam Chomsky "No âmbito do interpessoal, no domínio de como você e eu nos relacionamos como seres sociais, não existem áreas mais importantes do que a espiritualidade e a política." Ken Wilber "A política é o único poder disponível para aqueles que não têm poder." Daniel Innerarity "Sejas tu a transformação que queres ver no mundo." Mahatma Gandhi Metanoia é um termo transliterado do grego antigo que no contexto do cristianismo primitivo significava mudança da mente ou transformação interior, ou seja, um processo de mudança na maneira de pensar e dos estados mentais inábeis, visando atingir um novo nível de consciência e, consequentemente, uma nova forma de viver no mundo. Portanto, metanoia é um movimento pessoa

Os cegos, o elefante e a visão integral de Ken Wilber

Por L.C. Dias "Eu sigo uma grande regra: todo mundo está certo. Mais especificamente, todo mundo – inclusive eu – possui alguns importantes pedaços da verdade, e todos precisam ser honrados, valorizados e incluídos em um abraço gracioso, espaçoso e compassivo." Ken Wilber   Quando me deparo com as acaloradas disputas ideológicas - sejam políticas ou religiosas - sempre recordo da famosa parábola hindu dos cegos e do elefante que retrata tão bem a ilusão daqueles que reivindicam a exclusividade da sua verdade. Das várias versões existentes da parábola - tanto antigas quanto modernas - gosto desta versão resumida: "Sete sábios discutiam qual deles conhecia, realmente, a verdade. O rei, igualmente sábio, aproximou-se e indagou o motivo da discussão:  – Estamos tentando descobrir qual de nós é dono da verdade. Ao escutar isso, o rei pediu a um de seus servos que levasse sete cegos e um elefante até o seu palácio. Quando chegaram o rei mandou chamar o