Por L.C. Dias
"A visão holística de mundo que aqui apresento, está destinada a ser um incentivo para pensar pensamentos grandiosos, sentir sentimentos mais profundos e mais abarcantes e atuar como agentes do Poder que estrutura a evolução humana, seja lá como bem queiramos imaginar esse Poder. Está destinada a integrar alguns dos mais básicos conceitos, atitudes existenciais e realizações espirituais dos mundos oriental e ocidental.”
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"Toda a sociedade é baseada em relacionamentos. Toda a Terra é um campo imensamente complexo e integrado de relações mutuamente interativas. A evolução humana é uma série de mudanças no caráter básico das relações interpessoais e intergrupais."
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"Um novo nível evolutivo de consciência humana está agora, neste exato momento, buscando encontrar em homens e grupos, todos os pontos focais para a sua manifestação; e nesse nível a nota-chave é o amor-ágape, o amor entre companheiros através dos quais o homem pode encontrar agentes de síntese capazes de harmonizar suas miríades de potencialidades por meio da ação cooperativa."
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"A morte verdadeira e fértil é a da semente; pois, a partir da semente rasgada, a nova planta nasce - nova, porque dentro desta semente ocorreu uma mutação radical."
Dane Rudhyar
Dane Rudhyar nasceu em Paris, França, em 23 de março de 1895. Desde muito cedo, passou a compreender intuitivamente duas ideias que afetariam profundamente toda a sua vida e obra: (1) O tempo é cíclico e a Lei dos Ciclos descreve a trajetória de todas as civilizações, bem como a dinâmica de todo o cosmos; (2) A civilização ocidental se encontra agora no que poderia ser chamada de fase outonal do seu período de manifestação.
À medida que a sua compreensão sobre a vida se desenvolvia e a sua devoção pessoal pelo futuro da humanidade se agigantava, Rudhyar sentiu a necessidade de se divorciar da Europa e buscar um Novo Mundo, uma terra que possibilitasse, por assim dizer, o seu próprio cultivo como uma semente, carregando dentro de si o legado de tudo que é viável e foi construído no passado europeu.
No final do outono de 1916, chegou na América deixando para trás sua terra natal e sua cultura ancestral francesa, bem como seu nome de família, Chenneviere. A mudança de nome simbolizava a dedicação total ao seu ideal: a transformação da nossa civilização, uma reavaliação de todos os seus valores. Passou a ser conhecido como Rudhyar, um nome derivado da raiz sânscrito rudra, que significa ação dinâmica e energia elétrica liberada durante as tempestades. O deus Rudra é nos Vedas o destruidor e o regenerador, a energia transformadora que quebra os padrões antigos, e representa o poder da vontade e da força vital.
Esse senso de propósito possibilitou a Rudhyar liberar uma tremenda energia que ele canalizou para o desenvolvimento de suas ideias filosóficas: através da música e do uso do tom; através da pintura como a arte dos gestos; através da astrologia como linguagem simbólica, com o potencial para colocar os indivíduos em sintonia com os ciclos cósmicos.
Durante sua longa vida (1895-1985), por meio do uso de formas de expressão muito diferentes, foi capaz de invocar nos indivíduos, já agraciados com uma visão holística e uma abordagem transpessoal da vida, a necessidade de servirem como base para a construção de uma nova sociedade global; sementes de um novo ciclo evolutivo para a humanidade.
Rudhyar escreveu extensivamente sobre assuntos pertinentes à civilização, cultura e o surgimento de uma nova ordem social. Seus livros “Directives of a New Life” e “We Can Begin Again – Together”, forneceram uma perspectiva ampla, histórica e filosófica para os novos ideais sociais emergentes na década de 1970. Em “Crisis, Culture and Creativity” (1977), Rudhyar explorou o processo de civilização e o ritmo de seus muitos ciclos de cultura e nosso lugar e propósito dentro do grande processo planetário e cósmico.
Em seu livro "The Magic of Tone", fez menção ao importante conceito de processo de civilização, que está intimamente atrelado a sua visão cíclica da evolução humana e planetária:
“A civilização é um processo que opera através do desenvolvimento orgânico de muitas culturas de forma simultânea e sucessiva, cada uma das quais nasce, cresce, amadurece, decai e se desintegra mais ou menos rapidamente. Cada cultura atualiza em formas concretas e modos específicos de atividade um aspecto particular do potencial evolutivo inerente à humanidade. O processo de civilização, por outro lado, é um movimento planetário universalista, todo humano, mas só pode operar concretamente quando incorporado na substância psicomental de um povo e nos padrões fundamentais de uma cultura condicionada pelo clima, flora e fauna“.
“À medida que uma cultura é formada a partir de uma combinação de elementos novos e dinâmicos, acrescidos dos restos passados revitalizados por esses mesmos elementos inovadores, sua função na evolução geral da humanidade é incorporar uma nova qualidade humana ou Tom, um modo de vida ainda não experimentado com base em novos mitos, símbolos e instituições sociais”.
Outro importante livro de Rudhyar, também relacionado ao tema dos ciclos evolutivos, foi lançado no Brasil, pela Editora Pensamento, com o título “Preparações Ocultas para uma Nova Era”. Encontramos a seguinte apresentação na contra-capa:
“Neste livro, o autor afirma a sua esperança no mundo novo que estamos criando a cada instante e revela que é através da crise que surge um novo começo: ‘A semente tem de morrer para que a folha se desenvolva’ ”.
“Embora o autor tenha sido amplamente aclamado no campo da astrologia, este livro é essencialmente um estudo sobre o homem e sua relação com o Universo. É um estudo que reconhece o fato de que não é só o céu que nos afeta, mas que também nós o afetamos; que a evolução da vida é um processo criativo cíclico e que, para avaliar corretamente a condição do mundo hoje, é preciso ter uma visão ampla e evolucionária dele”.
“Dane Rudhyar sugere aqui que nós, os participantes deste ato de criação, somos ajudados nos nossos esforços para realizar o nosso potencial e que essa ajuda surge na forma de avatares, de anjos, de heróis, de gênios e de todos aqueles que fazem parte, consciente ou inconscientemente, de uma Fraternidade Oculta muito real. Preparações ocultas para uma Nova Era é, na verdade, uma ampla síntese de mais de 50 anos de trabalhos do autor, síntese essa que incorpora uma visão global da Doutrina Secreta de H. P. Blavatsky, abrindo nossas mentes e corações para novos horizontes”.
Da mesma forma, ao final do prólogo da terceira edição do seu paradigmático livro “Planetarización de la Conciencia”, Rudhyar faz a seguinte exortação:
“É um livro em que se expressa algo que considero uma intuição profunda e vívida do que a existência poderia significar para esta e futuras gerações de homens, desejosos de consagrar-se à tarefa de construir uma nova humanidade. A visão holística de mundo que aqui apresento, está destinada a ser um incentivo para pensar pensamentos grandiosos, sentir sentimentos mais profundos e mais abarcantes e atuar como agentes do Poder que estrutura a evolução humana, seja lá como bem queiramos imaginar esse Poder. Está destinada a integrar alguns dos mais básicos conceitos, atitudes existenciais e realizações espirituais dos mundos oriental e ocidental.”
“Durante toda a minha vida, fortemente focado na mente, mantive o princípio da síntese. Com a idade de vinte anos comecei a intentar um dos muitos projetos abortados, com o lema: Síntese – Solidariedade - Serviço. Estas palavras significam a mesma coisa em qualquer um dos três níveis básicos de atividade: mental, emocional e ativo. Várias décadas depois, eu ainda mantenho esse lema. Estamos no limiar de uma era de síntese; mas, a menos que os seres humanos estejam dispostos a ir além do individualismo egocêntrico que nossa sociedade tanto glorifica, e aprendam a sentir e viver em termos de solidariedade e serviço mais profundos, o tipo de síntese que a humanidade poderá testemunhar, será opressivo e alienador em seu totalitarismo."
Não posso deixar de confiar que este livro irá despertar em uma série de mentes abertas e sensíveis, o desejo e a vontade de repolarizar sua consciência, seu pensamento, assim como, seus amores e alianças, para que possam se juntar à companhia de indivíduos criativos que, caso estejam plenamente conscientes ou não, estão trabalhando livre, obstinada, intensa e amorosamente (e certamente também com uma grande dose de bom humor) pelo nascimento de um novo modo de vida e uma nova humanidade.“
Portanto, esta visão ampliada e profunda de Rudhyar, nutrida pela grande compaixão e sabedoria deste bodhisattva dos tempos modernos, nos inspira esperança e insufla na nossa alma a força necessária para que possamos seguir em frente, com coragem e determinação, na certeza de que todos os nossos esforços e padecimentos serão justificados, quando sintonizados com o novo ciclo civilizatório em gestação.
A seguir, disponibilizo a tradução do capítulo 6 do livro “Directives For a New Life”, escrito, em dezembro de 1970, como resposta às urgentes necessidades da emergente contracultura dos anos 1960-1970.
Cabe ressaltar que as ideias veiculadas neste livro cinquentenário permanecem atualíssimas como vias para uma compreensão mais ampla e realista, dentro da perspectiva místico-esotérica apresentada pelo autor, do atual cenário de agravamento, ou ápice, da crise que assola a nossa civilização planetária.
L.C. Dias
O tempo para a mutação é agora
Por Dane Rudhyar | Tradução de L.C. Dias
Uma coisa é imaginar e formular, mesmo em seus esquemas mais gerais, padrões de uma nova sociedade. Outra coisa seria propor "diretrizes" para uma ação consciente durante o longo e possivelmente trágico processo de transição do estado atual da humanidade para uma futura condição global de harmonia para a existência humana.
Os indivíduos profundamente descontentes e rebeldes, e ainda mais os povos oprimidos e/ou famintos da Terra, anseiam, ou exigem insistentemente uma ação. Mas que tipo de ação e em que nível? Em termos de violência ou por meio de lentos esforços políticos e diplomáticos usando os procedimentos institucionais atuais para transformar radicalmente as instituições, ou através de uma grande cruzada não-violenta na esperança de desintegrar as resistências e superar a inércia social pela magia do "amor" dramatizado - ou se esses modos de atividade social externa são considerados ineficazes, impraticáveis ou pelo menos parcialmente autodestrutivos, podemos colocar nossa fé em um processo interno de transformação? Em caso afirmativo, o que esse processo interno implicaria?
Deve ser bastante claro para qualquer pessoa capaz de pensar sem emoção e com um mínimo senso de historicidade que a imposição de ideais por ação violenta é uma operação autodestrutiva. As revoluções mudaram as estruturas políticas e, até certo ponto, os procedimentos econômicos ao removerem forçosamente a maioria dos membros das elites governantes, e deram a outra classe de pessoas a oportunidade de governar; mas essa mudança sempre provou ser principalmente externa. Mesmo quando finalmente é bem-sucedida em um sentido superficial, a violência em primeiro lugar gera mais violência, mais terror; as pulsões humanas básicas e a qualidade das relações interpessoais não são transformadas, pelo menos não por muito tempo. Se elas são mesmo parcialmente transformadas ou transmutadas, é porque alguns grupos de pessoas podem, sob as novas condições sociais, irradiar uma qualidade de ser que possa demonstrar objetivamente sua utilidade em reconstruir de forma nova alguns dos valores antigos que tinham sido perdidos no clima de violência destrutiva.
Vemos um bom exemplo desse processo quando olhamos para trás aos séculos que se seguiram ao colapso total do Império Romano no Ocidente sob o ataque dos "bárbaros" germânicos. Após o desmonte das grandes propriedades escravagistas, destruição de vias navegáveis e outros mecanismos de produção socioeconômicas, além das cidades se encontrarem em grande parte em ruínas, as pessoas confusas e perturbadas que buscavam refúgio, ocuparam muitos lugares sem sequer um conhecimento rudimentar da agricultura. No lento processo de reconstrução, os mosteiros beneditinos, que começaram a se formar aqui e ali durante e após o século VII d.C., tornaram-se pequenas ilhas de segurança e reconstrução humanas nas regiões deixadas no caos. Pouco depois, os monges celtas da Irlanda, que aceitaram o cristianismo de bom grado sem que abrissem mão do legado deixado pelos colégios celtas, viajaram para a Europa e também estabeleceram cadeias de mosteiros que serviram de refúgio e reeducação para o expansionismo espiritual do cristianismo.
Esses vários centros monásticos cercados por aldeões a quem ofereceram segurança em caso de ataques frequentes de bandos de bárbaros tornaram-se as "sementes" da cultura cristã da Idade Média. Essa cultura uniu toda a Europa ocidental em um sentido espiritual, mesmo sob as pressões políticas dos senhores feudais que lutavam continuamente pelo poder; e inspirou a construção das mais notáveis catedrais românicas e góticas.
Será que nossa sociedade ocidental também sucumbirá à investida dos novos "bárbaros", alguns dos quais estão no meio de nós, assim como os mercenários germânicos eram os componentes de uma grande parte dos exércitos romanos que guarneciam muitas cidades? As metades oriental e ocidental da nossa civilização se destruirão deliberadamente ou inadvertidamente? Ou podemos esperar mudanças físicas de grande importância, alterando profundamente as formas dos continentes, talvez como resultado de uma mudança dos polos, ou de alguma outra tragédia ecológica que produza mudanças severas no clima? Estas e outras possibilidades mais especulativas foram elucubradas. Elas poderão, ou não, se realizar; no entanto, parece difícil crer que o impulso insano e o orgulho cego do homem ocidental possam ser interrompidos, se não ocorrer uma intervenção mais ou menos espetacular, o que, sem dúvida, produziria resultados muito catárticos.
Parece haver apenas uma esperança para uma solução relativamente suave e progressiva. É a esperança de que os jovens que hoje estão seriamente envolvidos na "Grande Recusa" ao tipo de civilização ao qual estão submetidos os seus pais e avós, possam manter e desenvolver seus ideais de forma mais madura, e influenciar as nossas atuais instituições com seu sentimento de amor, beleza e paz. As questões cruciais são se há ou não um número suficiente desses jovens idealistas e se os mais velhos realmente querem esta intervenção, enquanto ainda estão no controle, ou resistirão a qualquer mudança básica em nossa "tecnocracia" e recorrerão a qualquer meio para frustrar, perverter ou destruir todos aqueles que ameaçarem o seu poder estabelecido. Outra incógnita é a reação dos jovens que retornam do Vietnã - e as consequências do hábito de usar drogas adquirido durante o período de guerra, bem como sobre a influência das drogas entre os adolescentes que agora ingressam em seus primeiros anos da maturidade.
Todos esses fatores e a falta de clareza sobre o propósito e o comprometimento, mesmo entre os muitos jovens que aspiram nutrir relacionamentos abertos que irradiem amor dentro de uma sociedade sã, nos fazem perguntar se não é mais sábio estar pronto para uma quebra mais ou menos radical da nossa sociedade atual - e isso não só nos Estados Unidos. Minha intuição pessoal foi, mesmo antes do início da Primeira Guerra Mundial, que nossa civilização ocidental atingiu o período simbólico da queda em seu ciclo. Muitas pessoas hoje esperam mudanças relacionadas a uma "Nova Era" mais ou menos conhecida como "Era de Aquário"; e também acredito que em pouco menos de cem anos começará um novo ciclo. Mas este é apenas um aspecto do problema. Não há nenhuma razão, astrológica ou de outra ordem, para acreditar que os primórdios desta Nova Era, ou de qualquer ciclo, irão introduzir uma condição geral de perfeita paz, inocência e união ideal entre todos os homens, mulheres e crianças – sem que seja considerada a possibilidade de superação de alguma provável catástrofe global que reduziria consideravelmente a nossa população mundial. Tudo o que se pode esperar é que essas condições ideais possam existir somente em grupos relativamente pequenos que de certa forma possam permanecer incólumes à desintegração externa, pois seriam similares aquelas sementes que permanecem incólumes à decomposição outonal.
Esses grupos de sementes podem se assemelhar ao que na sabedoria bíblica é falado como "o remanescente", e também conhecido como "o povo" (que também é o nome original de algumas tribos nativas americanas). A alegoria da Arca de Noé é também uma referência à existência de grupos de sementes em que a quintessência do passado é preservada e impregnada com a potencialidade do renascimento - renascimento após uma mutação radical na consciência.
A tradição universal de uma Era de Ouro durante a qual "os deuses caminharam entre os homens" é outro símbolo do estado de semente - que, quando ocorre, é experimentado por apenas uma porção da vida humana neste planeta. Pois, os fantasmas do passado desintegrado se prolongam, cercando esta condição da Era de Ouro. Mesmo após a semente germinar sob o sol vernal, germes pequenos e frágeis atravessam a crosta do solo ainda coberta de folhas em decomposição. Dentro da semente, "deuses" - as energias da vida e os grandes símbolos da vegetação futura - estão presentes. A espécie-vida está ativa em um estado focalizado dentro da semente; O homem está ativo dentro dos grupos de sementes irrevogavelmente comprometidos. Mas a humanidade ainda pode estar flutuando na escuridão e no materialismo alienante. Ainda assim, de alguma forma, o poder da semente será manifestado - no devido tempo e estação.
Um excelente professor de parse que conheci, B.P. Wadia, disse, há cerca de 45 anos, que "não há nada que você possa fazer com Kali Yuga, mas é um ótimo negócio poder fazer algo em Kali Yuga". E Kali Yuga representa a Era da Escuridão, mas também o período de gestação de uma nova humanidade. Ninguém pode parar a decadência de uma civilização cujo ciclo está terminando. Você só pode entender supostamente o que este "final" implica, e buscar fazer a melhor escolha: morrer com as folhas, mesmo que seja uma morte dourada durante o "verão indiano" de um ciclo de cultura - ou experimentar a vitória sobre a morte em um estado semente de união criativa.
Não devemos ser sentimentais sobre a morte natural; essa é realmente a grande doença americana! Um apego sentimental a coisas inúteis e obsoletas - ou pessoas - é um dos maiores obstáculos para a vida espiritual. Jesus disse: "Deixe os mortos enterrar os mortos - pegue sua cruz e me siga". Toda a personalidade espiritualmente consciente disse mais ou menos as mesmas palavras; mas o homem ocidental, através de séculos de materialização de ideais e do medo institucionalizado, se encolheu ante a inevitável mudança cíclica. A única morte a evitar é a morte inútil por uma causa fútil e estúpida, ou o tipo de morte artificial ofertada e destituída de sentido que ocorre em hospitais estéreis. A morte verdadeira e fértil é a da semente; pois, a partir da semente rasgada, a nova planta nasce - nova, porque dentro desta semente ocorreu uma mutação radical.
Claro que a verdade em tudo o que acabei de dizer em linguagem simbólica depende se o meu diagnóstico do estado do mundo está correto. Muitas pessoas podem acreditar que nossa atual crise mundial se refere apenas a um processo de reajuste sério, mas eminentemente construtivo, que deixaria inalterados os grandes valores básicos da nossa civilização ocidental, a coroa esplêndida da evolução humana; e para enfrentar as tempestades, o que precisamos é mais racionalismo, maior fé na ciência e na tecnologia, e também na visão de Deus inspirada pelos patronos americanos - e pelo árduo trabalho necessário para convencer o mundo inteiro de que essa visão é de fato, a "Nova Ordem dos Séculos" (Novus Ordo Seclorum) e que a tecnologia americana é a única maneira de atualizá-la.
Na verdade, não posso aceitar essa avaliação de nossa crise mundial, embora eu tenha vindo da França para a América há cinquenta e cinco anos com grandes expectativas e fé intensa no "Novo Mundo" cantado por Walt Whitman. Eu cheguei a uma América muito diferente do que é hoje, mas uma América já maculada pelo pesado carma da escravidão e da destruição deliberada das tribos nativas americanas; onde o vírus da industrialização europeia já havia crescido em proporções alarmantes.
Se eu estou correto no meu atual entendimento e avaliação de onde estamos agora, não só nos EUA, mas em todo o mundo, então, o que esses indivíduos podem fazer, indivíduos que compartilham do meu senso de valor, da minha visão e da minha dedicação à tarefa de preparação do caminho para uma nova sociedade mundial?
Se esses indivíduos aceitarem o destino de semente ou de mulher-semente, o que eles devem fazer é tornarem-se completamente abertos ao processo de mudança interior que resultará em uma nova mutação dentro de sua pessoa total - uma mudança interna, uma transmutação de valores, de ideais, de respostas sentimentais, da atitude em relação ao trabalho; trabalho a ser realizado com indivíduos orientados e comprometidos de forma semelhante em uma comunidade de espírito, de mente e de amor. Isso significa uma revolução na consciência focada e sustentada por relacionamentos grupais interpessoais - e não meramente a revolução vaga, difusa e emocional da consciência glamorizada hoje por escritores que provavelmente dão tudo por certo.
O foco da nova vida dentro de grupos integrados por uma visão clara do passado e do futuro, bem como pelas necessidades atuais, NÃO significa isolamento da sociedade e falta de preocupação com questões sociais e educacionais que possam ser significativamente modificadas por qualquer forma de ação social realizada dentro do alcance das estruturas institucionais de nossa sociedade atual. Em nossa sociedade quantitativa, o número importa. Não é necessário envolver-se em questões políticas para votar, apoiar e participar de empresas sociais e educacionais. Mesmo que seja obrigado pelas necessidades da vida a trabalhar em escritórios ou fábricas, a radiação da presença de uma pessoa orientada e comprometida com o futuro pode provocar mudanças sutis, mas valiosas. Em todos os lugares, a questão chave é a relação interpessoal - e o principal esforço é atrair indivíduos que estão em um estado de transição e numa crise de consciência longe da subserviência às tradições do passado, comprometidos em experimentar novas qualidades de pensamento, sensação e atuação - experiências após as quais não é possível retornar ao passado.
Há um tipo de pessoa que anseia pelo desafio de ser pioneiro de uma comunidade da "Nova Era" longe da atração das grandes cidades e das perversões da mídia. Essas "comunas" são muito necessárias, como matrizes para novas realizações pessoais e para a interação de relações interpessoais verdadeiramente abertas em uma atmosfera de trabalho cooperativo em um ambiente natural. Elas são significativas, em termos de construção de uma nova humanidade, na medida em que não são apenas um lugar de refúgio para as almas perdidas e mentes confusas, mas um campo para a transformação integral da pessoa. A partir dessas comunas, emergem mais grupos sementes totalmente comprometidos e integrados. Mas esses grupos de sementes podem ser formados sob quaisquer condições e em qualquer ambiente social ou racial.
A questão central é trazer uma mutação irreversível na consciência e nas respostas sentimentais.
O primeiro passo nesse processo é inevitavelmente um descontentamento pessoal interno com o que é. O segundo passo é a abertura e assimilação de novas ideias e o entusiasmo para estimular uma transformar mental baseada em símbolos e imagens - o que leva mais frequentemente a encontrar um "exemplar" inspirador, e talvez um guia. O terceiro passo é permitir que as novas realizações, as relações de transformação e o trabalho em comum repolarizem em profundidade tudo o que foi e, acima de tudo, o ego que há tanto tempo buscou a constante autoafirmação e glorificou as suas autoimagens que outras pessoas foram convidadas a refletir, se não admirar ou adorar.
Muito pouco pode ser feito sozinho. Mesmo o "gênio" aparentemente solitário e recluso depende do poder dinamizador das relações humanas. Mesmo o guru precisa de chelas para cumprir seu destino. Relacionamento é o único agente básico da metamorfose. A questão crucial que permanece em aberto é reconhecer quais as qualidades interpessoais que deverão ser cultivadas.
Toda a sociedade é baseada em relacionamentos. Toda a Terra é um campo imensamente complexo e integrado de relações mutuamente interativas. A evolução humana é uma série de mudanças no caráter básico das relações interpessoais e intergrupais. Em primeiro lugar, durante muitos milênios, o homem vivia e progredia através de relações tribais, assim como os animais funcionam em colônias, rebanhos ou sociedades complexas totalmente controladas por imperativos biológicos e instintos compulsivos. Então as tribos cresceram e se transformaram em impérios; sangue e mente inter-fecundados; e o ego-homem surgiu, com ciúmes de sua independência e sua capacidade relativa de controlar seu destino limitado como uma pessoa individualizada e como um pensador. Agora, pelo menos, uma fase crucial deste processo revolucionário de individualização está chegando ao fim; e pode ser um fim trágico para uma grande parte da humanidade e uma catarse radical para aqueles que permanecerão como sementes para uma sociedade futura.
Um novo nível evolutivo de consciência humana está agora, neste exato memento, buscando encontrar em homens e grupos, todos os pontos focais para a sua manifestação; e nesse nível a nota-chave é o amor-ágape, o amor entre companheiros através dos quais o homem pode encontrar agentes de síntese capazes de harmonizar suas miríades de potencialidades por meio da ação cooperativa. Este novo nível de evolução humana pode não ser totalmente ativado nos séculos vindouros; pode haver sub-ciclos dentro de ciclos maiores, e podemos testemunhar apenas uma pálida luminosidade presente num amanhecer precoce. No entanto, o desafio está conosco, hoje. Na verdade, está dentro de nós. Recusar-se a aceitá-lo só pode significar a derrota espiritual para a pessoa, individualmente, e, por mais insignificante que seja, para toda humanidade.
Todo o resto é secundário. As pessoas estão reclusas; grandes massas de homens e mulheres sofrem privação agonizante ou exclusão sem sentido para o corpo e a alma. A violência atinge os transeuntes nas ruas abarrotadas e nos cortiços fétidos, como também, nos atrozes campos de batalha. No entanto, tudo isso é secundário. Uma ação terrível seguida de uma reação passional, mas inútil – tudo se passando de forma recorrente. Tudo faz parte desta fase necessária, mas talvez desnecessariamente trágica, da evolução humana através da qual vivemos e morremos. Mas agora é a hora da mutação. É uma mutação básica, tão fundamental como aquela que levou o homem tribal a formar civilizações onde as mentes e os indivíduos aprenderam a pensar, a questionar, a ganhar independência pessoal, a afirmar sua vontade de ego e ansiar por poder pessoal e entusiasmo mórbido.
A mutação será pelo amor. O poder mágico da harmonia. A mudança, permeada de belos padrões de união. União criativa. Criatividade presente em todos os amanhãs humanos dentro do vasto campo de uma Terra cujos limites se estendem muito além do meramente mensurável e do estritamente físico. O belo campo de uma Terra purificada e transfigurada.
Nota do Tradutor: O texto foi adaptado e revisado a partir da versão preliminar fornecida pelo Google Tradutor (translate.google.com.br).
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