Por Vicente Merlo
"Mas, quando as pessoas falaram sobre a 'morte de Deus' e o fim das religiões, surgiu uma nova espiritualidade, ao mesmo tempo em que renasceu certos fundamentalismos religiosos, uma espiritualidade que eu gostaria de chamar de mística, transreligiosa e esotérica."
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"Uma espiritualidade que não quer ignorar o ecológico, o econômico, o social e o político. Uma espiritualidade integral que não perde de vista a vida diária, sendo esta, na realidade, o campo de evidência de sua autenticidade. Uma espiritualidade, por outro lado, que está ciente da importância da dimensão do eco-pacifismo e do feminismo. Uma espiritualidade que quer mulheres felizes e homens felizes, sem esquecer de forma alguma da justiça, e além dela, do amor."
Vicente Merlo
Acompanho o pensamento de Merlo desde o lançamento, em língua portuguesa, do seu livro “Os Ensinamentos de Sri Aurobindo – O Yoga Integral e o Caminho da Vida”, em 2010. Depois deste primeiro contato, comecei a estudar os demais livros de sua autoria, infelizmente, ainda não traduzidas para o português, mas disponíveis nos idiomas espanhol e inglês.
Merlo é um pensador original e de profundidade que possui um raro talento para agregar ideias das mais diversas fontes de conhecimento, sejam religiosas, filosóficas ou esotéricas, não privilegiando a filosofia ocidental em detrimento das sabedorias orientais, nem desqualificando o conhecimento de matiz esotérica.
Aliás, é exatamente neste ponto que o seu pensamento se destaca com uma originalidade sem igual, pois não tem medo de se aventurar no terreno nebuloso, hermético e muitas vezes contraditório do esoterismo, sempre buscando desvelar aquilo que possa enriquecer e ampliar a nossa visão de mundo muitas vezes limitada pelo já estabelecido.
Nesta vertente, em 2008, publicou um importante livro intitulado “La Llamada (de la) Nueva Era: Hacia una Espiritualidad Mistico-Esoterica “, onde realiza um estudo sério, meticuloso e abrangente sobre o movimento Nova Era nas suas mais variadas formas de expressão, que certamente será considerado, em breve, como literatura de referência para o tema.
Outro ponto a destacar é que sua abordagem não é meramente teórica, fruto de um exercício mental puramente especulativa, mas está fundamentada na experiência direta, através da vivência de práticas espirituais, como a meditação e o yoga.
Além da abertura ao novo, possui a agudeza crítica de um filósofo associada à visão intuitiva de um místico. Desta forma, está municiado de ferramentas cognitivas que permitem desvelar aquilo que está além das palavras com discernimento e sabedoria.
Em seu último livro, “Espiritualidad transreligiosa. Sabiduría oriental y pensamiento integral”, publicado em 2017, Vicente Merlo combina nossa herança religiosa com a psicologia transpessoal e a sabedoria oriental - especialmente o hinduísmo e o budismo - para elaborar um paradigma de pensamento integral à altura das importantes transformações da consciência que o mundo contemporâneo atravessa.
Com certeza, o pensamento de Merlo é uma das minhas principais fontes de inspiração para vários temas que serão abordados nas próximas postagens deste blog. Pois, como Merlo, busco ir além das crenças estabelecidas, sem desdenhar o valor legado pelas grandes tradições de sabedoria, rumo a uma espiritualidade genuína: transreligiosa, mística e esotérica. A seguir, uma breve apresentação do seu último livro.
Com certeza, o pensamento de Merlo é uma das minhas principais fontes de inspiração para vários temas que serão abordados nas próximas postagens deste blog. Pois, como Merlo, busco ir além das crenças estabelecidas, sem desdenhar o valor legado pelas grandes tradições de sabedoria, rumo a uma espiritualidade genuína: transreligiosa, mística e esotérica. A seguir, uma breve apresentação do seu último livro.
L.C. Dias
Rumo a uma espiritualidade transreligiosa, mística e esotérica
Por Vicente Merlo | Tradução de L.C. Dias
Ninguém escapa da crise atual, porque não é apenas econômica e financeira, nem mesmo ecológica e social. Tudo isso é verdade, mas na base há uma crise de valores. E os valores se sustentam em uma ou outra concepção do mundo e da vida. Durante a maior parte de sua história, a humanidade fundamentou a sua vida em valores religiosos. As religiões institucionalizadas têm dirigido em grande parte os destinos da humanidade. Judaísmo, Cristianismo e Islã, mais próximo geograficamente de nós. Hinduísmo, Budismo, Taoísmo e muitas outras "religiões", embora nem sempre tão conhecidas, fizeram o mesmo em outras partes do planeta. Mas, a partir do século XVIII, com o Iluminismo e especialmente desde meados do século XIX com o positivismo, marxismo, vitalismo e muitas outras correntes, a crítica das religiões estava crescendo, pois, os aspectos negativos das mesmas - que têm havido tantos como os positivos - não poderiam esconder-se por mais tempo. A verdade é que uma onda de materialismo e ateísmo atravessou o mundo com intensidade crescente desde meados do século XIX até meados do XX.
Mas, quando as pessoas
falaram sobre a "morte de Deus" e o fim das religiões, surgiu uma
nova espiritualidade (ao mesmo tempo em que renasceu certos fundamentalismos
religiosos), uma espiritualidade que eu gostaria de chamar de
"mística", "transreligiosa" e “esotérica". Que significa
isso?
"Transreligiosa"
porque não se identifica exclusivamente com qualquer religião histórica e
institucionalizada (como era habitual até então, uma vez que a espiritualidade
dificilmente era concebida para além de uma ou outra das religiões), mas nem as
rejeita e nem as condena em bloco, como se fossem apenas instrumentos de
manipulação política, de ópio do povo ou de consagração de uma projeção de
autoridade paterna em um Deus-Pai.
"Mística"
porque interessa mais a experiência pessoal, a experiência da dimensão
espiritual do ser humano e da sociedade do que os dogmas, os mitos e os ritos
esvaziados de sentido. Eu entendo a "experiência mística" em um
sentido muito amplo, desde estados superiores de consciência (transpessoais)
até experiências de quase morte, passando por estados de meditação, lucidez
silenciosa, amor compassivo, alegria sublime, contatos com seres ou realidades espirituais,
de consciência cósmica, de consciência não dual, não local, etc.
E
"espiritualidade esotérica" porque abre a uma série de faculdades,
de conhecimento, de práticas, que durante uma boa parte da história da humanidade
permaneceu "escondida" para a maioria das pessoas, não só para as
pessoas comuns, mas também para religiosos (exotéricos), cientistas e
filósofos, em seus paradigmas dominantes. Esotérico porque, às vezes, eles têm
como ponto de partida uma "Iniciação" através da qual se produz uma
abertura ou um salto qualitativo em direção ao despertar espiritual e a vida
não é mais governada pelos interesses do ego psicológico e passa a ser dirigida
pela alma, pela consciência transpessoal, nossa natureza de Buda, a consciência
de Krishna, o Cristo interno, o Espírito, chame-a como você quiser, pois essa
nova espiritualidade é muito cuidadosa para não se aferrar excessivamente às
ideias, palavras, crenças e símbolos (Cristo, Buda, Krishna). Sem negar a sua
realidade histórica ou trans-histórica, os símbolos são agora considerados como
meios de acesso ao Sagrado, ao Mistério, ao Aquilo mais além de todo o nome que
dá sentido às nossas vidas e que fundamenta os nossos valores.
Finalmente, é uma
espiritualidade que não quer ignorar o ecológico, o econômico, o social e o
político. Uma espiritualidade integral que não perde de vista a vida diária,
sendo esta, na realidade, o campo de evidência de sua autenticidade. Uma
espiritualidade, por outro lado, que está ciente da importância da dimensão do
eco-pacifismo e do feminismo (tão longe do hembrismo
radical e exclusivista quanto do machismo, do androcentrismo e do
patriarcalismo já tão desatualizados e agonizantes). Uma espiritualidade que
quer mulheres felizes e homens felizes, sem esquecer de forma alguma da justiça,
e além dela, do amor.
Fonte na Web
Fonte na Web

Doutor em filosofia, escritor e professor, especializado em yoga, budismo e hinduísmo, Vicente Merlo Lillo viveu vários anos na Índia. Foi sócio fundador da Sociedade de Estudos Indianos e Orientais, bem como da Associação Transpessoal Espanhola. Estudou em Bombaim, Pondicherry e Auroville; Ele é pesquisador do Centro de Estudos Interculturais Vivarium, que foi dirigido por Raimon Panikkar, membro do Conselho Consultivo do Parlamento das Religiões do Mundo (Barcelona, 2004) e destacado incentivador dos estudos de indologia na Espanha. Professor do Mestrado em História das Religiões na Universidade de Barcelona e na Universidade Autônoma de Barcelona, seus últimos livros são "Meditar - en el hinduismo y el budismo" (Kairós, 2013), "Filosofía ¿qué es eso? Pensar y ser en Occidente y Oriente" (Biblioteca Nueva, 2014), "Sabiduría y gratitud" (Kairós, 2015) e “Espiritualidad transreligiosa. Sabiduría oriental y pensamiento integral” (Ediciones La Llave, 2017).
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